quinta-feira, junho 22, 2006

Cruzes Canhoto!








Ao que parece, o exame de Português do 9º ano foi fácil. Nem Camões nem Gil Vicente. Parece que "saiu orações", como disse um aluno ao jornal Público (edição de hoje).
Mas o melhor foram mesmo as cruzes!



Parece é que, mesmo com cruzes e orações, os resultados não serão grande coisa. Certo é que se verifica como normalíssimo o uso do sistema de respostas múltiplas, ou de "cruzinhas", em exames de Língua Portuguesa. É assim como o totoloto. "A gente" põe lá a cruz e reza.
Atrevo-me a sugerir à nossa ilustre ministra da Educação que use este método a 100% e lhe junte a componente do jogo de forma explícita, isto é, a pagar. Uma espécie de loto; o "escoloto", se quiserem. O "escoloto" joga-se assim: cada aluno pode escolher as cruzinhas que entender, desde que as pague; por exemplo a um euro cada "cruzinha". O nível de aproveitamento escolar dispararia para o topo da lista da UE e o ministério arranjava uma dotação suplementar digna de respeito.

É claro que nem todos poderiam pagar o número de apostas, perdão, de respostas necessário para garantir o prémio, desculpem, a aprovação, mas os exames sempre foram assim, não foram? Nem todos têm o mesmo crédito, quero dizer, o mesmo mérito.
(Hoje a boca está a fugir-me para a verdade! Bolas, bolas, bolas! - Eu não digo!)

Rui Semblano

nota post(erior):
Uma deficiência técnica no formato da imagem desta entrada impedia a sua visualização correcta.
Problema resolvido.

segunda-feira, junho 19, 2006

Esta é a ditosa Pátria, minha amada?




Por estes dias, o orgulho nacional tem no futebol a sua única razão de existir. A nós, pouco importa que o país esteja a afundar-se no lodo, desde que o resto do mundo pense que Portugal é um dos maiores entre os maiores da bola.
Tal e qual como o Brasil.




Entrada completa, abaixo. 666




Em que medida tem a selecção nacional de futebol do Brasil contribuído para tirar o seu país da miséria? Em nada. Tal como o Carnaval, é um mero escape. Enquanto duram, o Carnaval ou o mundial de futebol, o Brasil esquece as suas prisões, as suas favelas, os seus condomínios-fortaleza, os seus sem-terra, os madeireiros da Amazónia, os "mensalões" e os "anualões" dos políticos, o analfabetismo, a criminalidade, tudo. Passa a viver nas televisões de todo o mundo, como uma novela em que a ilusão de uma mulata coberta de pó de ouro ou de um menino de rua tornado ídolo da bola mostram o que o Brasil não é, mas passa a ser nos cafés de Marselha ou de Tóquio, nos pubs de Dublin ou nas esplanadas de Melbourne.

A imagem projectada por estes eventos cria um Brasil de sonho que passa a ser real para os estrangeiros, os que estão longe de saber como é, de facto, o Brasil. E para os brasileiros? Terminado o mundial ou o Carnaval, os jogadores regressam aos seus clubes milionários como as mulatas despidas do ouro regressam às suas favelas; os brasileiros, esses regressam ao seu surreal quotidiano, melancólico e repetitivo, em que tentam o equilíbrio que lhes permitirá escapar à queda definitiva no abismo... Muitos deles, porém, já nele caídos, apenas sonham ser possível regressar ao arame, um dia. Aguentar ao menos para chegar àqueles três dias por ano ou àquelas semanas mágicas, de quatro em quatro anos. Vivem para isso. Muitos vivem por isso. O resto, como veio demonstrar Lula da Silva, é um pesadelo de que não se acorda verdadeiramente. Um Brasil sem Carnaval e sem Mundial de futebol seria um inferno que nem as telenovelas ajudariam a suportar.

Afinal, dirão alguns, sempre faz alguma coisa pelo seu país, a selecção do Brasil. Pois faz. Mas nada que o tire da miséria. Querendo ou não, até ajuda a que a miséria se mantenha. E agora pergunto: é isto que queremos para Portugal?

Ao ver uma bandeira portuguesa pendurada numa varanda de um prédio degradado, imagino o tipo de orgulho nacional que sente a alminha que a lá pôs. Hoje, não consigo vibrar com as vitórias da selecção "de todos nós", porque hoje, a nossa Nação está reduzida a um trapo pendurado à janela, com o patrocínio de um Banco, de um jornal ou de uma loja de electrodomésticos... Não admira que os brasileiros se sintam cada vez mais em casa neste país.
E se, por um acaso, Portugal for campeão neste mundial de futebol, o povinho vai sair à rua, em histeria completa. E passaremos a viver no melhor país do mundo.

Rui Semblano
19 de Junho de 2006


nota post(erior):
Este texto foi publicado nas Cartas ao Director do jornal Público de 22 de Junho de 2006, com o título "Orgulho Nacional". (na edição Web - impressa - link só para assinantes do publico.pt)