segunda-feira, julho 28, 2003

O Poste


Confesso que sou avesso a regras e códigos de conduta, embora reconheça que, em casos pontuais, eles sejam necessários, por vezes até essenciais, de modo que mais avesso sou à ideia de que se possa aplicar um código deste tipo à blogosfera.
Claro que é um espaço público e claro que as coisas que aqui se escrevem são para partilhar com inúmeros desconhecidos que as lêem, de onde a natural preocupação de alguns em preservar este espaço, poupando-o a excessos, mas tal preocupação, embora legítima, não deve transformar-se em perseguição ou obsessão.

Os blogs não são como os jornais, onde se pretende informar de forma generalizada e, preferencialmente, isenta, e onde existem, apesar disso, espaços próprios de opinião.
Quem dá a sua opinião nesses espaços, como Miguel Esteves Cardoso ou Filomena Mónica, para citar dois exemplos ao acaso, não vincula o jornal às suas palavras, sendo este, apenas, o seu veículo, o seu suporte.
Nada impede um autor de um artigo de opinião de difamar alguém ou insinuar sobre algo nas suas crónicas. O tempo do lápis azul já lá vai e, em democracia, existe a liberdade de expressão, essa "fera", como a outra, a "blogos".
Ao fazer uma ou outra coisa, porém, o autor está a assumir as consequências do que escreve, pois, na balança da democracia, os deveres pesam mais que os direitos, embora exista muita gente que pense que não é assim.
Os que são difamados ou as entidades sobre as quais algo grave se insinuou, têm o direito de proceder judicialmente contra o autor de tais artigos e este, a verificar-se que o fez de forma gratuita, não baseada em factos, mas em suposições, será punido.

Um código de conduta da blogosfera, por muito simples e perfeito que seja, será sempre pletórico, porque, precisamente, além de redundante será nocivo. As leis aplicáveis à blogosfera já existem. Vivemos com elas. São as mesmas pelas quais nos regemos diariamente. O resto, como em tudo na vida, mesmo o que não parece, depende de cada um e é de sua exclusiva responsabilidade. Dele se destaca o bom senso, não só de quem aqui escreve, como de quem aqui lê. Bom senso para saber até onde se pode ir ao escrever, conforme o supomos ou disso temos provas (1); bom senso para saber onde o que se escreve como ironia se confunde com precisão; bom senso para distinguir entre o que é escrito sob nome próprio e o que é escrito por pseudónimos, tantas vezes usados para fins menos inofensivos que a procura do anonimato por discrição, pudor ou timidez.

Existe, porém, um livro de regras específico que muito gostaria de ver aplicado à blogosfera, embora consciente de que o escrito atrás se lhe aplica de igual modo: o da linguística. Não o da língua portuguesa, nem o da inglesa, ou outra, mas o de bem escrever qualquer língua. No caso do português, mais usado na blogosfera lusa, o problema maior são os neologismos de bolso (2). Como sugeriu FJ, no post "Metablogando II", os termos emergentes da blogosfera são, muitas vezes, metagramas de outros metagramas, geralmente originários num anglicismo, às vezes num galicismo.
A frase anterior é um bom exemplo. Palavras como o substantivo "blogosfera" ou o verbo "metablogar" são metagramas com origem em "weblog+sphere" e "meta+weblogging", metagramas elas mesmas, em inglês. Pode escrever-se, por exemplo, "blog" ou "blogue", isto é, usar a palavra original ou o "neoanglicismo", pois ao longo do tempo, e com o uso, ficará definido qual o termo de uso corrente que vingará. Pessoalmente, prefiro assumir as palavras estrangeiras, até porque, no exemplo de "blog", a sua pronunciação já traduz o significado, a tal ponto que quase torna "blogue" mais uma onomatopeia que um metagrama! O que me entristece, por vezes aborrece, mesmo, é quando se tenta criar um neologismo para uma palavra estrangeira para a qual já existe correspondência em português.

É o caso, por exemplo, de "poste".
Escolho este exemplo porque é duplamente irritante. Por um lado, já existe uma palavra portuguesa para o estrangeirismo que se pretende assimilar, por outro, é uma palavra portuguesa com um significado preciso. Um poste é um poste, c'os diabos!

"Weblog" é simplificado para "blog", na língua original, e se traduzir tal substantivo significa passar a escrever "Diário-de-bordo-de-utilizador-da-rede-informática-internacional" o melhor é deixá-lo quietinho, quando muito criando um "neoanglicismo" do tipo "blogue"; porém, a palavra "post", aplicada a um weblog, não precisa de uma montanha de palavras portuguesas para ser traduzida. A sua tradução, neste caso, será "registo" ou, mais tecnicamente (e correctamente, pois se trata de um diário de bordo), "entrada".

Assim, para mim, a escolha é óbvia. Ou se usa o inglês, que tem as mesmas características da palavra "blog" em termos de identificação, ou se usa uma das palavras portuguesas correspondentes. Agora... "Poste"!?
Se o tivesse lido num obscuro canto da blogosfera, como este onde escrevo, ou escrito por alguém que dá seis erros de escrita numa frase com cinco palavras, ainda vá lá, mas ao dar com um mimo destes num blog escrito em bom português e por universitários e licenciados, como foi o caso, já me preocupa mais (e nem vou dizer onde, pois pode ter sido uma gralha ou um malvado corrector automático - repetida várias vezes, mas vá, fica o benefício da dúvida).
E seria agora, ao falar do português que se fala e escreve nas nossas universidades, que entraríamos no domínio do Ensino, mas não aqui que este poste já vai alto, perdão, que este post já vai longo.
Ainda vou apanhar este vírus no computador. Vai uma aposta?

Rui Semblano
Rua dos Polacos, 104 3º
4430-174 Vila Nova de Gaia
(para o caso de terem apagado os registos da UP)

(1) Não foi, por exemplo, excesso da minha parte chamar mentiroso ao Reitor da UP, Novais Barbosa ("Linces - Lince II"), pois posso prová-lo e já o disse em público muitas vezes - aguardo o processo por difamação há anos, mas ainda não tive tal sorte. Aí está porque quem leu tal coisa e viu o meu nome só pode pensar que tal é verdade ou que não me importo de sofrer as consequências de estar eu a mentir. E reparem que esta afirmação não foi proferida numa carta privada ou num café, mas perante jornalistas da imprensa, da rádio e da televisão - algo diferente de o escrever num blog... Mesmo à Sombra.

(2) Assim como um dos maiores problemas da língua portuguesa são os livros de bolso. Leio cada coisa nos da Europa América (o meu pai era entusiasta* desta editora) que nem vos conto!

* Não escrevi "fan", mas podia tê-lo escrito. Também não escrevi "fã", mas nunca o escreveria. Ou em português ou no original, por favor. O resto só a brincar.

nota:
As entradas de qualquer blog, em qualquer ponto da blogosfera, são de domínio público assim que são publicados "on line" (em linha, como diria JPP). Antes de fazer click (clicar?) em "publish" não faça como o Pedro Mexia, isto é, pense duas vezes.

Click.

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