O repto que fiz n'A Fábrica foi aceite.A resposta do Armando Ésse, em e-mail,indica a Lusa como fonte das declaraçõestranscritas na sua entrada de um comunicadoda Reuters. (Come again?) Mas era esperado.Se existem, porém, interpretações mais softdas provocações de Mahmoud Ahmadinejad eu não as conheço. O que esperar do Irão?Entrada completa, abaixo. Em última análise, Mahmoud Ahmadinejad mais não fez do que ir buscar as palavras do Ayatollah Seyyed Ruhollah Khomeini (lembram-se dele?), mas isso é o mesmo que ir buscar as palavras de Adolf Hitler em lugar de usar as próprias. Para grande parte da população islâmica de todo o mundo,
"riscar Israel do mapa" não é um eufemismo;
"riscar os palestinianos do mapa", aliás, também não o é para muitos judeus. Quanto a revisionismos, temos muitos e maus exemplos em todo o mundo, islâmico ou não.
Não são, portanto, ideias novas e não há, de facto, novidade nenhuma nas palavras de Mahmoud Ahmadinejad; o que há é a possibilidade de se tornar presidente de um país com capacidade nuclear - entenda-se "militar". Esse é o real problema.
Em 1973, parece ter ficado demonstrado, Israel esteve a um passo de usar a arma nuclear contra a Síria e o Egipto, durante a guerra do
Yom Kippur. Confrontado com uma derrota que pusesse em causa a sua existência, não tenho dúvidas de que Israel usaria armamento nuclear. Não me agrada a demagogia de Fernando Rosas, mas sou obrigado a admitir que tem razão quando pergunta o que nos faz pensar que Israel nuclear é mais confiável que o Irão nuclear (
Público, 08 de Fevereiro 2006,
"O Irão e o Nuclear"). A resposta está na natureza da confiança. Desde a Guerra Fria que o Ocidente confia no juízo dos EUA em matéria nuclear; uma confiança cega, de acordo com o antigo secretário da Defesa de Kennedy e Johnson, Robert Mcnamara, para quem a resolução da crise dos mísseis de 1962 se ficou a dever a pura sorte. Essa confiança, cega ou não, é o que nos leva a entender um aliado nuclear dos EUA confiável e a desconfiar de um seu inimigo com a mesma capacidade, ainda que potenciais (inimigo e/ou capacidade).
O que eu não vi, nem ninguém, foi aproveitada a oportunidade de início de abertura proporcionada pelo antigo homem forte iraniano, concorrente de Mahmoud Ahmadinejad nas últimas eleições, Ali Akbar H. Rafsanjani, que foi perfeitamente ignorado pelos EUA (e pela Europa). Mahmoud Ahmadinejad já não sofre o mesmo tratamento; não só não é ignorado como é trazido para a ribalta em cada comunicado da Casa Branca relativo ao Médio-Oriente. Mais uma vez, apetece perguntar se não será este radical um sonho tornado realidade para os
neocons do
"New American Century", que sempre advogaram o estabelecimento de um controlo efectivo sobre o ouro negro, os seus produtores e distribuidores estratégicos, especialmente no Médio-Oriente.
(1)No Irão, até aqui relativamente cooperante com os EUA (não esqueçamos que é o único travão a uma revolta shiita no sul do Iraque e à desordem completa no Afeganistão), a subida de tom nas provocações aos EUA, à Europa, enfim, às Nações Unidas, tem por objectivo demonstrar essa realidade.
De facto, a mera possibilidade de controlar efectivamente a situação no Iraque e no Afeganistão - o controlo real é um embuste; nunca interessou aos EUA - passa pelo Irão. É sobre isto que Mahmoud Ahmadinejad realmente fala ao dizer que o Ocidente precisa muito mais do Islão que o contrário. Na essência, é de controlo energético que fala, naturalmente - o único controlo que os EUA procuram deter no Médio-Oriente, aliás, esse sim efectivo.
(2)A perversidade da situação, porém, é de tal ordem que me vejo forçado a concordar com a opinião de que o Irão de Mahmoud Ahmadinejad armado nuclearmente é um perigo. É no motivo que conduz a esse perigo que discordo; isto é, Mahmoud Ahmadinejad não é um maluquinho que vai bombardear Israel com a primeira bomba nuclear que conseguir produzir, mas é um fanático que pode bem ser manobrado nesse sentido - inclusiva e principalmente pelas reacções dos que temem que tal coisa venha a suceder.
Não se compare o incomparável.
Mahmoud Ahmadinejad não é Adolf Hitler e Vladimir Putin não será Neville Chamberlain. A História não irá repetir-se tão cedo, precisamente por ser demasiado cedo. Ninguém encostou os alemães à parede; a Alemanha prosperava e todos queriam relacionar-se com ela entre 1936 e 1938. Mesmo após a invasão da Checoslováquia não sofreu sanções significativas (para não dizer nenhumas) e todos procuraram um entendimento real e a não agressão.
Hoje, todos procuram agir contra o Irão, um país pobre e subdesenvolvido, cuja riqueza em petróleo mais pára nos bolsos de alguns ocidentais do que contribui para o avanço do país.
Hitler era como um pastor-alemão admirado e afagado por todos, que um dia resolveu morder a mão que lhe estendiam, sem que quem a estendeu tivesse feito algo para isso. Mahmoud Ahmadinejad é como um tigre acossado por todos e encurralado, em que ninguém quer tocar e de que todos têm medo.
A pressão, se não cessar, tornar-se-á insuportável e conduzirá a um ataque desesperado do animal que, então, será abatido. E o pior é que é exactamente isto o que se pretende. Resta saber se vai ser conseguido. E a que custo.
Rui Semblanonota:
Gostava de conhecer o teor dos contactos mantidos entre Israel e os EUA relativamente ao Irão de Mahmoud Ahmadinejad. Aposto que são de natureza bastante diversa dos que surgem nos jornais. É que Israel, por sua culpa, está impossibilitado de dialogar directamente com o Irão (mesmo secretamente), o que torna uma situação desagradável num dilema trágico.
(1)
Saddam Hussein era aliado dos EUA e mantinha o Golfo em respeito (incluindo o Irão). Quando começou a inebriar-se com o seu poder, os EUA usaram-o para se estabelecerem na Arábia Saudita e no Koweit. Quando decidiu indexar o seu petróleo ao euro, arrastando consigo a OPEP, foi cilindrado.
Em 1991, os EUA não acabaram com Saddam Hussein para evitar o que hoje sucede e porque, ingenuamente, acreditaram que poderiam controlar a besta que haviam fabricado à distância. Ao completar a estrada para Baghdad, dez anos depois, mostram que não assistirão impávidos aos desafios de ninguém à sua supremacia, especialmente da Europa, pouco lhes importando o preço.
A questão do preço é, aliás, enganadora, pois os custos da actual guerra e a sua repercussão na economia dos EUA são diametralmente opostos aos lucros das companhias petrolíferas norte-americanas e ao impacto da guerra nas suas estruturas. Demagogicamente, o presidente G. W. Bush vem alertar para os perigos e malefícios da sobredependência dos EUA em relação ao petróleo (o árabe, em particular), mas se compararmos a preocupação das petrolíferas com a guerra no Iraque à que as mesmas demonstraram quando do Katrina, percebemos que algo está errado, ou melhor, que algo estava há muito preparado e muito bem planeado, na eventualidade de um conflito com o Iraque (e o Irão) acontecer.
(2)
Veja-se como tudo o que as tropas da "coligação" no Afeganistão se limitam a fazer é defender as rotas e pipelines de distribuição de combustíveis, não se empenhando em estabilizar e, consequentemente, deixar o país.nota post(erior):Armando Ésse, o proprietário d'A Fábrica que motivou esta entrada, comentou-a via e-mail. Aqui fica o seu comentário, na íntegra. Reprodução autorizada pelo autor.(quote)Muito bom post.A atitude de desafio por parte de Mahmoud Ahmadinejad nos últimos tempos, é uma atitude de quem está consciente que os Estados Unidos não têm capacidade financeira e orçamental para fazer uma intervenção unilateral, juntando a isto, uma opinião pública americana que não dá, neste momento, grande espaço de manobra à Administração Bush. E só esta limitação financeira da parte dos EUA é que faz com que a troika europeia tenha sido envolvida nas negociações com o Irão, para que se num futuro próximo houver uma intervenção ela seja financiada pela comunidade internacional.É pena que não se possa fazer comentários, no próprio post.Um abraço.Armando Sousa(unquote)Caro Armando (e leitores d'A Sombra),Sendo um blog editorial, A Sombra apenas se contacta via e-mail, mas todos os comunicados são bem vindos e recebem tratamento imparcial, reservado que está, naturalmente, o direito de admissão para casos mais complicados (não se trata de seleccionar opiniões, mas modos de expressão, naturalmente).Rui Semblano
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