pergunta 3:
Como funcionaram tão bem os telemóveis dentro deaviões em vôo a 11 de Setembro de 2001 se desde entãose gastaram milhões e milhões no desenvolvimentode sistemas que permitam esse tipo de ligações?Esta é uma questão fracturante, pois as suas variáveis transformam a plausibilidade em embuste (e vice-versa). O que importa saber, quanto a telefones celulares e aviões, é como o seu funcionamento (que é bem real e não uma fantasia - os celulares funcionam bem desde aviões em vôo, excepto a partir de determinada altura) se processa.
Em terra, o celular busca o sinal proveniente de um repetidor/transmissor (parte da rede do operador) e usa-o para estabelecer a comunicação. E no ar? Até determinada altura (variável conforme o perito a quem se fizer a pergunta) a comunicação processa-se do mesmo modo, isto é, o celular faz a varredura de frequências electrónicas em busca de sinal, que pode recolher de diversas fontes, mas que acaba por ser retransmitido a partir de um sistema terrestre. E é neste processo que está o problema. A chamada pode ser conseguida a custo da queda da aeronave de onde é efectuada. A potência da emissão do celular, esforçada ao máximo dada a distância a que estão possíveis repetidores/transmissores no solo (note-se que não se trata de telefones por satélite), interfere com a electrónica do avião, podendo mesmo iniciar uma falha catastrófica do sistema aeronáutico e a queda do mesmo. Note-se ainda que um telefonema feito a partir do ar e em movimento implica uma muito rápida passagem de uns retransmissores a outros, o que interfere não só com a chamada em si como também desestabiliza o sistema em terra.
Em 10 de Janeiro de 2000, dez passageiros e a tripulação de um Saab 340 morreram quando este caiu perto de Zurique. A causa: uma mensagem SMS recebida por um dos passageiros e uma chamada de voz de um outro, que desregularam os sistemas de navegação da aeronave.
Este acidente esteve na origem da proibição total de uso de telemóveis em vôo, e levou a um processo de investigação e desenvolvimento de tecnologia que permita fazê-lo de forma segura que ainda hoje prossegue, ao custo de biliões de euros.
Em 2002, o
USA-Today relatava:
"Os telemóveis poderão em breve atingir terreno proibido: os vôos comerciais de passageiros. Pelo menos duas companhias, a Aircell e a Verizon Airfone, estão a desenvolver tecnologias que permitem aos passageiros o uso de celulares a bordo de aeronaves sem fazer entrar em ruptura quer a electrónica dos aviões quer a rede móvel terrestre. (...) A Aircell, a companhia mais próxima de atingir resultados satisfatórios, avança 2004 como o ano da implantação do serviço."
A 15 de Fevereiro de 2004, o jornal
Público anunciava que "O construtor aeronáutico europeu Airbus anunciou hoje ter experimentado com êxito o uso de telemóveis em vôo, abrindo a porta à sua utilização generalizada no futuro. (...) O sinal emitido pelos telefones móveis foi dirigido para uma célula no interior do aparelho, que por sua vez o envia para um servidor destinado a transmiti-lo à terra graças à rede de comunicação por satélite
Globalstar. (...)"
Em Fevereiro de 2005, era anunciado que a Airbus tencionava instalar a bordo do seu "Jumbo", o A380, um sistema de comunicações dedicado aos telefonemas a partir de celulares que evitaria os problemas já descritos. O sistema seria controlado pela tripulação que poderia barrar chamadas de voz, por exemplo, permitindo apenas o serviço SMS. O serviço ainda não está totalmente implementado; e embora a Airbus o possa já instalar em diversos modelos de aeronaves, além do A380, a decisão final compete às companhias aéreas. A TAP, por exemplo, ainda hoje apenas considera
testar o sistema.
Nos EUA, com todas as condicionantes que a aeronáutica civil sofre desde Setembro de 2001, os sistemas deste tipo não estão a ser bem sucedidos. A Verizon, por exemplo, anunciou o cancelamento do seu serviço, entretanto implementado, para o final deste ano. Apesar de tudo, são mais as condicionantes de ordem financeira que as de origem técnica o que está a provocar o desinteresse das companhias norte-americanas por este serviço. E, sem sistema activo, não há chamadas.
Esta longa introdução pretende evitar mal-entendidos.
Não está em causa se era ou não possível ter efectuado chamadas de celulares a partir dos aviões envolvidos no 11 de Setembro de 2001. A resposta, embora não absoluta, é sim. O problema está nas condicionantes. Um "sim, mas..." enorme.
Grande parte das conclusões a que chegou a comissão de inquérito do 9/11 tem por base as comunicações entre o solo e os aviões envolvidos nos ataques. Parte dessas comunicações foi feita entre passageiros a bordo desses aviões e seus familiares, amigos ou colegas de trabalho. A maior parte dos telefonemas deste tipo ocorreram de e para o vôo 93 da United Airlines, que se concluiu ter caído em Shanksville, na Pennsylvania.
Entre os registos destes telefonemas, encontra-se um que é particularmente intrigante, pois é entre um passageiro e a sua mãe. Nele, o passageiro identifica-se usando o seu nome e apelido, pelo menos por duas vezes. Que me recorde, nunca disse algo muito diferente de "Mãe? É o Rui." ou mesmo "Sou eu." ao iniciar uma conversa telefónica com a minha mãe; nunca diria "Sou eu, Rui Semblano." - muito menos duas vezes e muito menos durante o sequestro de um vôo em que viajasse. Por muito traumatizante que fosse a experiência, ela não anularia dezenas de anos de intimidade com a minha mãe.
Outro registo inquietante é o de Barbara Olson, passageira do vôo 77, que se concluiu ter embatido contra o Pentágono. A chamada está registada como feita a partir de um telefone do avião. A certa altura, ela pergunta ao marido, Ted Olson, alto responsável da Procuradoria Geral dos EUA, com quem falava ao telefone, o que deve dizer ao piloto do aparelho, ao que parece sentado junto dela e dos restantes passageiros, na traseira do avião. É um facto estranho, durante um sequestro, e vem negar a versão que coloca os sequestradores aos comandos dos aparelhos apenas nas fases finais dos vôos, até então tendo obrigado o piloto e o co-piloto a navegar conforme as suas direcções. Mas isto nada prova. E era a esta conclusão que deveriam ter chegado os investigadores da Comissão para o 9/11. Usar estes registos como guia é uma coisa. Explorar a sua autenticidade para lá de qualquer dúvida é outra. Considerá-los como prova admissível em tribunal, outra ainda.
Como vimos, sem o recurso a ligações por satélite controladas pela tripulação dos aviões, o uso de celulares a bordo provoca anomalias nos sistemas aeronáuticos. No entanto, apesar da profusão de telefonemas a bordo, todos os objectivos foram atingidos, com excepção do pretendido pelo vôo 93, pelas razões apontadas no relatório (a queda provocada pela tentativa de subjugação dos sequestradores por parte dos passageiros), embora tudo no mesmo indique que ele teria sido atingido, fosse ele qual fosse, sem a intervenção referida. Ou seja, os telefones funcionaram às mil maravilhas e os sistemas aeronáuticos também.
Com o número existente de incidentes provocados por utilizadores teimosos de telemóveis a bordo de aeronaves, que afectaram a navegação das mesmas, é estranho que quatro aviões, na mesma manhã, tenham sido palco de tanta conversa por esse meio sem que um só tenha sentido dificuldades técnicas - a que corresponderia, sem dúvida, algo mais sério que uma admoestação, tendo em conta que não seriam os tripulantes a agir em conformidade e sim os sequestradores.
E não deixa de ser muito estranho que uma operação planeada minuciosamente durante meses para sequestrar aviões e voar durante longos trajectos no país com os céus mais vigiados e a aviação militar mais avançada do planeta, tenha simplesmente desprezado o controlo das comunicações a bordo. Mas essa não é a questão.
A questão é como foi possível efectuar tantas chamadas sem problema algum quando os sistemas que o possibilitam eram ainda embrionários.
É o que exijo saber.
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Ir para a pergunta 45 / 911cinco perguntas, cinco anos depois© A Sombra 2006A base para esta série de entradas é constituída porapenas duas fontes: "The 9/11 Commission Report" e"Loose Change (2nd Edition)".Ignoro as respostas para as cinco perguntas formuladasao longo desta série de entradas.Quero respostas. Tenho o direito de as exigir.Rui Semblano, 11 a 15 de Setembro de 2006Fotomontagem:"It's 'planes in the phone', stupid!" © A Sombra 2006nota:O índice completo destas entradas encontra-se usando o ícone respectivo na coluna da direita.