sábado, março 24, 2012

Março 22. Portugal.

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A greve geral de 22 de Março foi marcada por vários incidentes envolvendo jornalistas que cobriam o evento. O mais divulgado foi o da agressão a Patrícia Melo, fotojornalista da AFP que fotografava a manifestação que decorria no Largo do Chiado. Os polícias da PSP não gostaram de ser apanhados em filme e, possivelmente após tirar a foto que reproduzo abaixo, Patrícia Melo foi violentamente agredida à bastonada, visível na sequência que se exibe no início desta entrada, captada por um colega da agência Reuters.


Momentos antes, uma foto de Patrícia Melo, AFP

Mas não foi só Patrícia Melo a ser agredida pelo simples facto de ser uma profissional da comunicação social com uma câmara em punho. No mesmo local, José Sena Goulão da Lusa foi também agredido à bastonada pela polícia, terminando por necessitar tratamento hospitalar, e a cena repetiu-se um pouco por todo o lado, em mais um exemplo clássico de como os governos lidam com a liberdade de informação, reforçado aliás por instrucções precisas a gestores de empresas públicas para não responder a qualquer pedido de informação sobre a greve da parte da comunicação social.

Estas tentativas de supressão, restrição e controlo da informação por parte de quem detém o poder são práticas generalizadas há muito e se hoje são mais visíveis pelo simples facto de que cada cidadão com um telemóvel é um potencial fotojornalista com capacidade de publicar o que capta em redes sociais de impacto mundial, devemos recordar que sempre existiram em formas mais ou menos violentas e com resultados mais ou menos graves, dependendo da localização dos mesmos no tempo e no espaço. No Chile dos anos 70, por exemplo, Patrícia Melo poderia "desaparecer" convenientemente, depois de receber tratamento. No Irão de hoje, talvez desaparecer mesmo antes de receber qualquer tratamento. O poder lida sempre muito mal com manifestações públicas de descontentamento e protesto, e uma vez após outra reage com o mesmo desgosto e desapontamento de quem tenta fazer o melhor pelos que, ignorantes, reagem contra as suas acções políticas. Afinal, ou se respeita a democracia ou se é antidemocrata.

Chamem-lhe greve geral ou manifestação expontânea ou qualquer outra actividade pública que resulte na demonstração de descontentamento mais ou menos organizada de cidadãos pela forma como são governados, a cartilha democrata de resolução de conflitos com a base popular diz sempre o mesmo: é preciso salientar o direito à indignação e à liberdade de expressão - pedras basilares da democracia - e logo a seguir reduzir esse direito à condição de catarse, de toda a maneira impossível de sobreposição ou, Deus nos livre, alteração do direito supremo de governar conferido aos detentores do poder pela mesma base popular que tem todo o direito de protestar contra os seus eleitos.

A democracia, tal como a conhecemos, dá absoluto poder e exige submissão absoluta - com a ressalva da ocasional manifestação pública de descontentamento, na condição de que se extinga minutos após, resignada ao poder do voto popular. E sempre com o mesmo olhar paternalista de quem não percebe muito bem como quem escolheu lebre não se contenta com gato, o poder explica que quando prometeu lebre ignorava o real número de lebres existentes e, sobretudo, a imperativa necessidade de escolher gato! Tudo a bem da Nação.



Patrícia Melo de câmara apontada, claramente ameaçando as forças da ordem.

A bastonada ilustrada nesta entrada é a expressão desse desgosto paternal de quem pretende dar ao mundo a imagem de responsabilidade e autoridade que convém passar e acha que a maneira de o fazer é transmitir a noção de respeito às massas, nem que seja à força de censurar qualquer outra imagem que o desminta ou desautorize. É uma prática desajustada à realidade actual, mas que ainda retém o poder de conferir um certo descanso e reconforto a quem, do alto mais alto, observa atentamente. Nada de novo ou particularmente eficaz, portanto, mas todavia significativo.



O segundo seguinte.

As agressões generalizadas de 22 de Março, sobretudo contra os cidadãos que se manifestavam nesse dia por todo o país, demonstram o desconforto sentido pelo poder quando confrontado com a manifestação pública de descontentamento popular e também o tal desgosto paternal que menciono acima, qual pai tirano que é forçado a dar uns tabefes no filho rebelde que não sabe nem tem capacidade para entender a lógica que lhe é imposta para seu próprio bem, atitude reforçada pelo facto de que nesta história o "filho" foi quem escolheu o "pai".
Este desgosto desconforável tem vindo a crescer em todas as democracias ocidentais, que cada vez mais olham a China como o tão desejado e infelizmente impossível (para já) exemplo a seguir. Ah, como tudo seria mais simples se a cidadania se confinasse em fábricas de iPads e iPhones paga ao cêntimo/hora e sem outro direito que o de trabalhar até cair. Lá chegaremos. Ou não.
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domingo, março 11, 2012

Ghost dancing.

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More disturbing news from Afghanistan today... A US service man seems to have lost it and allegedly went on a killing rampage, targeting civilians for no apparent reason and killing many of them. In this type of military engagement, also known as conventional warfare, things like this happen all the time. Unfortunate? Yes. Avoidable? Hardly. War is a nasty business, always was and always will be. When you have thousands of kids out there, armed and ready to go, things can turn ugly at any time. And the more the conflict endures, the more likely some incidents like this will happen. (...)

[ler a entrada completa no Jack & Honey]
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sábado, março 10, 2012

Jean Giraud (Moebius) . 1938-2012


 
Desapareceu um dos meus fazedores de sonhos predilecto. Moebius, Jean Giraud de nascimento, sucumbiu a noite passada após prolongada doença. Foi com o Incal que o descobri, nos idos de 80, e esta obra prima marcou-me para sempre. E como custaram a passar aqueles 3 anos entre "Ce qui est en haut" (ver a minha página do Facebook - e ainda aqui) e "La cinquième essence"! Meu Deus, publiquem lá o final! E então descobrir com um misto incrível de desapontamento e excitação que Jodorowsky e Moebius haviam dividido o quinto e último episódio da saga em dois, "Galaxie qui Songe" e "La planète Difool". Era apenas o primeiro volume! Aaaargh! Que raiva e, ao mesmo tempo, que magnífica satisfação! A Quinta Essência teria duas partes.

As aventuras do detective privado de classe R John Difool, do seu inseparável Deepo, de Animah (a adorável Alma), de Tanatah, do implacável e terno Metabarão, do impagável Kill cabeça-de-cão e do fantástico Solune, o andrógino perfeito, estão gravadas na minha memória e fazem parte do que sou tanto como a literatura, a pintura, a escultura, a música, o cinema, a fotografia e toda a arte que nela habitam. Ah, a Arte e os bonecos da banda desenhada... Talvez por todos esses desenhos tomarem vida na minha mente à medida que os absorvia, por lhes dar vida e música e dimensão, por lhes ter sido dada alma pelos génios combinados de Alejandro Jodorowsky e Jean "Moebius" Giraud, os integrei tão fácil e avidamente em mim como qualquer outra grande obra de arte que tive a felicidade de ler, observar ou escutar.

Moebius ficará para sempre presente na sua vasta obra e, como cada vez que um talento desta magnitude se extingue, fica a saudade do muito que ainda havia para conhecer e que, por agora, permanecerá algures fora do nosso alcance, quem sabe na garagem hermética onde Jean Giraud agora desenha... Gosto de acreditar que é assim.

[ver esta entrada no Jack & Honey]
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quinta-feira, fevereiro 23, 2012

José.

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Parece impossível, mas já passaram 25 anos desde que o Zeca se foi. A cada 25 de Abril a Grândola passa depois do adeus, às vezes filosofal, de quem nem sabe bem quando nasceu Portugal. Precisamos de outro Zeca, e outro mais ainda, a cantar o país de hoje antes que o resto seja fado.
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Sete fadas me fadaram
Sete irmãos m'arrenegaram
Sete vacas me morreram
Outras sete me mataram

Sete setes desvendei
Sete laranjinhas de oiro
Sete piados de agoiro
Sete coisas que eu cá sei

Sete cabras mancas
Sete bruxas velhas
Sete salamandras
Sete cega-regas
Sete foles
Sete feridas
Sete espadas
Sete dores
Sete mortes
Sete vidas
Sete amores

Sete estrelas me ocultaram
Sete luas, sete sóis
Sete sonhos me negaram
Aqui d´el rei é demais
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sábado, fevereiro 18, 2012

Whitney E. Houston . 1963-2012

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Espero que Whitney esteja agora num sítio melhor, e também espero que ela possa ver o que estou a ver agora. O seu memorial. A sua vida, através das suas canções, tocou a minha por vezes de forma significativa. E fez o mesmo para tantos outros em tantas outras formas, tão diversificadas como significativas... Ouvindo os testemunhos em discurso e canto no seu memorial, observando a explosão de sentimento só possível na igreja baptista da Nova Esperança onde a sua voz nasceu para o mundo, tão intensos e respeitosos e solenes... Faz com que a verdadeira extensão desta perda se revele, como se revela para milhões em todo o mundo que partilham a mesma ligação com Whitney, independentemente da sua forma.

Espero que Whitney esteja agora num sítio melhor. E nesse lugar, onde quer que seja, a sua voz será ainda boa o suficiente, como Kevin acabou de dizer. Ainda é suficientemente boa para mim, neste momento, e sempre o será. Aos que tentam diminuir a sua vida, os seus feitos e essa voz, mesmo quando o seu corpo repousa sobre o chão dessa igreja, digo apenas que se calem e mostrem algum respeito. Asseguro-vos que quando chegar a vossa vez de repousar num qualquer solo de um lugar qualquer, esperando ser transformados em pó, não terão de se preocupar com o menosprezo alheio.

Descansa em paz, Whitney Elizabeth Houston. Serás recordada com saudade.
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quinta-feira, fevereiro 16, 2012

Eco. Talvez um.




The power of blogs...
Realmente, quem tem um blog tem tudo e quem não tem não tem nada.

(Fabien Jeune - n'A Sombra, 12 de Julho de 2003)

sábado, dezembro 24, 2011

segunda-feira, novembro 28, 2011

De Auschwitz a Pittsburgh


Com o aproximar do Natal e as anúnciadas primeiras neves (deve nevar amanhã pela primeira vez, este Outono), é altura de arrumar a casa e resgatar a àrvore e as decorações natalícias da cave. A meio de tais tarefas dei pelas minhas notas do tempo em que fui voluntário no Museu da Força Aérea dos Estados Unidos (permaneço ligado à Fundação do Museu como "amigo", mas não é o mesmo).
Aqui fica uma delas:

3 de Julho, 2010

Uma jovem mulher mostrou aos seus dois filhos, no mapa dos campos de concentração da exposição sobre o holocausto, o local onde a bisavó de ambos esteve internada durante a Segunda Guerra Mundial. Apontava com o dedo para uma área no Sul da Polónia, talvez Auschwitz-Birkenau, quando um dos pequenos lhe perguntou: "E onde fica Pittsburgh?" (no mapa) Ela sorriu e apontando o braço para Este, disse: "Ali, bem longe."

Muitos fugitivos judeus encontraram refúgio nesta parte de Ohio e as suas famílias aqui vingaram e permaneceram. Um dos meus colegas no museu é ele mesmo um sobrevivente do holocausto e as fotos de família tiradas antes da fuga fazem parte da exposição permanente sobre esse período - e lá está ele, pequenito, longe de imaginar que ia iniciar a sua viagem para o Novo Mundo.
Como ele, muitos dos voluntários que trabalham no museu são pedaços vivos da História que tornam ainda mais fascinante o maior museu de aviação militar do mundo.

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segunda-feira, maio 09, 2011

Em suma...

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Shadow, shadow on the wall...

Ontem foi o dia da Mãe nos Estados Unidos - para a minha mãe sempre foi a 8 de Dezembro, agora é quando calha, ou seja, no primeiro Domingo de Maio e até o chamam "das mães" (e eu que pensava que mãe há só uma...) e foi há uma semana que os Seals mataram Osama Bin Laden mas nada disto faz esquecer a crise; aqui, como em Portugal, a longa e lenta mas inexorável marcha rumo ao social-corporativismo continua. Adeus socialismo, adeus capitalismo... Tenho de admitir que transformar de uma assentada toda a classe média - liberal ou conservadora - em órfãos ideológicos é brilhante mas, em rima, adiante.
Os beija-flores regressaram, a terra está pronta para mais uma plantação de tomates, as àrvores retomam o esplendor primaveril, o gato está a reagir bem à cadela velhinha que vai passar uns tempos cá em casa, com quatro novos Michelin o "barco" desliza suave e, finalmente, o Sol brilha e faz calor - sim porque, este ano, as pás de neve e os baldes de sal só desceram à cave em meados de Abril.
Em suma, a vida continua... Como a luta.
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It's raining again...

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segunda-feira, junho 22, 2009

Neda é o seu nome.

neda


Neda Agha-Soltan (Persa: ندا آقا سلطان - Nedā Āġā-Soltān; nasceu em 1982, morreu em 20 de Junho, 2009)


As imagens do assassínio de Neda ainda estão comigo. Acredito que sempre estarão. Como as imagens de Mohammed al-Durrah, o rapaz de 12 anos morto com o seu pai durante a Intifada de 2000, em Gaza. Ao contrário da imagem do homem do tanque fotografada por Jeff Widener em Tiananmen, em 1989, as imagens de Neda e Mohammed mostram a morte de completos inocentes, mortos apenas por estar ali. Não estavam em frente a um blindado. Estavam apenas na rua, no dia em que morreram.

Neda Agha-Soltan não estava a atirar pedras aos Basiji ou a gritar contra o regime dos Ayatollahs, nem sequer estava perto de manifestantes a agir desse modo. Era uma mulher que caminhava na rua, vindo de ou indo para uma manifestação contra o governo que oprime o seu povo, um direito concedido pela constituição iraniana. Apesar disso, foi seleccionada e abatida a sangue frio enquanto caminhava pacificamente, no que é um sinal claro da verdadeira natureza do regime Iraniano: o fascismo.

Ela era uma mulher no Irão. Uma mulher que, como tantas outras, de tantas e tão variadas formas, aspirava por mudança. Ela, como tantas outras mulheres iranianas, ganharam nova esperança com o movimento nas ruas de Teerão, de Esfahan, de Tabriz, de Kerman, grassando como fogo em palha seca. Isto faz da sua morte um símbolo maior para os que buscam a liberdade, pois verdadeira liberdade implica a dignidade do ser-humano e o ser-humano não tem dignidade quando os seus direitos básicos são suprimidos. Tornou-se uma mártir de uma causa maior, muito maior do que outras causas que se alimentam do martírio. Ela não morreu nas barricadas, na linha da frente desta luta, mas andando pacificamente pela rua; ela morreu não por ter ousado ser livre, mas por sonhar ser livre.

As bestas fascistas que a assassinaram, como todas as bestas fascistas, não aprenderam que é impossível matar o sonho. Mas tentam. Tentam com todas as suas forças e todos os seus meios. Não terão sucesso. E, apesar disso, no mesmo momento que escrevo estas palavras, fora do Irão cresce o medo deste fogo que cresce. O papel do Twitter, do YouTube e do Facebook na revolta iraniana é menosprezado cada vez mais; os paranóicos do controlo no poder tentam ajustar-se, compreender como isto é possível e como manipular e bloquear a verdade nesta nova era da informação; os ditos "fazedores de opinião" esbracejam desesperados num mundo em que a opinião não mais é exclusiva e em que a palavra enfim subjugou a espada; os falsos profetas da democracia gritam e vomitam bílis desavergonhadamente para tentar deter este desastre aparentando acarinhar valores que desprezam; agora vertem lágrimas falsas por Neda, quando o mundo sabe quantos inocentes como ela mataram antes. Para os libertar, naturalmente. Sem vergonha.

Espero verdadeiramente, como muitos outros, que a morte de Neda, e as mortes de centenas de outros iranianos, não tenha sido em vão. Espero verdadeiramente que o povo iraniano conquiste finalmente a sua liberdade e abrace a verdadeira democracia, abandonando a religião como estrutura social e entrando no mundo moderno, mantendo a sua fé enquanto direito individual. Espero verdadeiramente que todos nós aprendamos finalmente como respeitar os iranianos e como os ajudar a atingir esses objectivos e, enfim, parar de arranjar formas de lucrar com este tipo de mudança e com isso servir interesses que em nada respeitam ao povo iraniano. Num mundo em convulsão, os revoltosos iranianos são heróis. Lembremos Neda, mas nunca esqueçamos os que permanecem lutando por aquilo a que ela aspirava e que nunca terá. E acima de tudo, asseguremos que eles o terão. Para eles mesmos.

Inch'Allah.


O meu obrigado a Navid Aghabakhshi pela ajuda na correcta escrita de "Neda" em Farsi, na imagem acima. Khayli mamnoon.


[simulpost004/09: aqui em inglês (in Jack & Honey)]

neda

terça-feira, junho 16, 2009

Bliss of another kind...



Hoje fui (mais uma vez) agradavelmente surpreendido pela minha esposa. (*) Estava embrenhado no Twitter em tempo real do tópico #iranelection quando reparo que tenho uma mensagem directa dela - método que os twitters que se seguem mutuamente usam para comunicar em privado. Tinha simplesmente um link e a exclamação "Taaaa Daaaa!".

Ao seguir o link fui dar a um novo blog (**), de sua autoria! Ainda tenho o sorriso estampado na cara.
Aqui fica a ligação e, claro, o Hysterical Roots passa a constar dos blog links sp, n'A Sombra, bem como da lista Blogosphere Watch, no Jack & Honey.

Bem vinda à blogosfera, minha querida.
Que as "raízes histéricas" cresçam e proliferem!



Tori Amos . Bliss . Best Of Tori Amos




* A imagem é um esboço tirado do meu Moleskine de 2007. É fácil adivinhar quem é.
** Curiosamente, ela escolheu para o "Hysterical Roots" o mesmo template do "Local & Blogal"! E esta?

[simulpost002/09: aqui em inglês (in Jack & Honey)]

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segunda-feira, junho 15, 2009

Power to the Twitter.


Sim, viver na Europa, onde as notícias internacionais são parte importante e significativa do ciclo noticioso de televisão, rádio e jornais, estragou-me com mimos. Ainda assim, sempre confiei na Internet como complemento da informação, e procurei na blogosfera e outras redes sociais o que se escrevia sobre o assunto em questão. Agora que vivo nos EUA, aquilo que já sabia tornou-se evidente: as notícias internacionais, no dia a dia, são extremamente escassas e a cobertura do que de importante acontece fora de portas é sofrível. A última bisbilhotice em Washington ou o mais recente pseudo-escândalo político arrebatam por completo ciclos noticiosos diários, deixando pouco ou nenhum espaço para outra coisa. E ao fim-de-semana é para esquecer - repetições infindas de velhas notícias e programas prégravados, quase nenhum espaço para reportagem em directo.
Agora adivinhem o que aconteceu este fim-de-semana...

O mundo tinha os olhos postos nas eleições iranianas e esperava uma dramática mudança de acontecimentos; Ahmadinejad enfrentava a oposição credível de Mousavi e os níveis de votação revelavam-se fantásticos. Então, duas horas após o encerramento das urnas, veio o anúncio oficial da vitória de Ahmadinejad com mais de 60% dos votos. Sabendo que se tratavam de votos em papel que teriam de ser sujeitos a contagem manual, só isto indicava que algo tinha corrido terrivelmente mal. Não tardou nada que os iranianos, indignados, saíssem à rua gritando "Fraude!". A blogosfera explodiu e aceder à informação que existia em Teerão tornou-se mais e mais difícil; telefones, electricidade e servidores de Internet deixavam de funcionar. Enquanto a tensão atingia um dos pontos mais altos, a polícia em buscas porta a porta para retirar discos de satélite e os estudantes encurralados nas faculdades, Larry King entrevistava um "biker" na CNN (prégravado, claro). Sem Internet, saber dos acontecimentos que ocorriam em Teerão teria sido impossível. Os jornalistas estrangeiros no Irão encontravam (e ainda encontram) inúmeras dificuldades na realização do seu trabalho e muito pouco do que se estava a passar transpirava para o exterior. Com todos os canais de comunicação convencionais cortados ou censurados pelas autoridades iranianas, uma nova plataforma de comunicação demonstrou ser eficaz na esquiva ao corte de informação, resistindo então e ainda a todas as tentativas para o neutralizar. O Twitter.
Os iranianos com uma conta no Twitter, que já antes servira para a organização da campanha eleitoral, desencadearam uma torrente de informação, organizada em tópicos e contas colectivas e contando ao mundo, em tempo real, o que lhes estava a acontecer. Não tardou muito para que lhes encontrássemos o rasto e a informação começou a fluir nos tópicos principais, os "Trending Topics", de forma avassaladora. Claro que as fontes são muitas e muitas delas questionáveis ou mesmo dedicadas a desinformar, mas para quem está habituado a filtrar fluxos de informação na Internet é relativamente fácil saber quem é e quem não é de confiar.
Tópicos como #iranelection tornaram-se a fonte principal de notícias vindas de Teerão e de todo o mundo, com actualizações em tempo real do que estava a suceder no terreno e do que estava a ser confirmado por fontes fidedignas; do estudante num telhado de Teerão ao último alerta noticioso da Al Arabiya assistíamos ao desenrolar da História como nunca antes e, mais importante, participávamos nela activamente, editando as nossas próprias descobertas ou passando (retwitting - RT) informação importante ou adicionando uma nota pessoal, uma mensagem ou um comentário.

Aqui fica uma amostra do que está a passar no Twitter enquanto escrevo:

@persiankiwi confirmed - there is shooting in Azadi sq. protesters wounded and shot, no numbers yet, still hearing gunfire. #Iranelection
MarjonRostami: Thanks to everyone updating #IranElection. You are making a difference. Time to focus on work. I'll update as I get calls from Iran.
iran09 RT @PouyanA: CONF! there is #shooting in #Azadi sq. protesters wounded and shot, no numbers yet, still hearing gunfire. #Iranelection
jimsciuttoABC #iranelection sev reports of pro-govt militia firing on protesters, AP photog reports one protester dead
dailydish More Video Of The Crowds: CNN gets some video, finally. But then you hear a simple statement from the anchor tha.. http://tinyurl.com/l6tvrw
RuiSemblano RT @LaraABCNews: Iranian State TV reports gun shots at Mousavi rally; AP photog sees govt militia fire at protesters #Iranelection

O último tweet (entrada no Twitter) é meu... A milícia governamental dispara contra manifestantes na Praça Azari, em Teerão. Um dos tweets este fim-de-semana reflectia um sentimento que não é novo, o de que fosse um jornalista americano a ser morto em Teerão e teríamos cobertura 24 horas sobre 24 nos canais de televisão dos EUA.
Vivemos num mundo cínico. Hoje temos os olhos postos no Irão, mas por quanto tempo? Aproveitemos ao máximo, pois, e asseguremos aos iraquianos o apoio que necessitam - não enviando tanques e bombas, mas fazendo saber que não estão sós e fazendo ouvir as suas vozes.
Mousavi não é um Obama, certamente. O seu passado demonstra, claramente, aquilo em que acredita no que respeita a relações externas, mas a sua visão do que deve mudar na sociedade iraniana faria uma enorme diferença e, talvez, seria um passo decisivo na direcção de uma vida melhor para os iranianos e de uma nova postura mais honesta em relação ao resto do mundo. O Irão mudará ao seu próprio ritmo e a partir de dentro, tal como o Iraque teria mudado. Se o tivéssemos permitido. A única forma que a democracia tem de acontecer num país é através da vontade e do sacrifício do seu povo. Talvez os apologistas da "Exportação da Democracia" devam aprender este facto hoje, mas não penso que o aprendam pelo simples facto de que estão bem conscientes do que defendem e porquê - e não é a exportação da democracia, seguramente. Tal como o simpático clube privado que mais não é que um bordel, a fachada deve manter-se por razões de relações públicas, para que o verdadeiro negócio continue no seu interior.

O que percebi este fim-de-semana foi que existe sempre esperança para os que amam a liberdade e temem o sempre crescente controlo da sociedade por grupos de interesses ou governos, especialmente no controlo da comunicação e da informação. Há sempre maneira de fazer saber a verdade e no mundo de hoje surgiu uma ferramenta que demonstra esta inevitabilidade, mesmo através da mais densa treva. Usemos o Twitter, pois, e passemos palavra.


[simulpost001/09: aqui em inglês (in Jack & Honey)]

nota post(erior):
O poder dos twitters:

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Monday, June 15, 2009

Down Time Rescheduled

A critical network upgrade must be performed to ensure continued operation of Twitter. In coordination with Twitter, our network host had planned this upgrade for tonight. However, our network partners at NTT America recognize the role Twitter is currently playing as an important communication tool in Iran. Tonight's planned maintenance has been rescheduled to tomorrow between 2-3p PST (1:30a in Iran).

Our partners are taking a huge risk not just for Twitter but also the other services they support worldwide—we commend them for being flexible in what is essentially an inflexible situation. We chose NTT America Enterprise Hosting Services early last year specifically because of their impeccable history of reliability and global perspective. Today's decision and actions continue to prove why NTT America is such a powerful partner for Twitter.
posted by @Biz at 4:17 PM


[unquote]

Extraído de Twitter

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terça-feira, junho 09, 2009

Remodelação...



Os mais curiosos já deverão ter descoberto o meu novo blog
em terras do tio Sam, construído de raíz no novo sistema
de edição do Blogger.
Chegou a altura de actualizar o template d'A Sombra.
Não se admirem se o esquema habitual parecer caótico
nos próximos... hmmm... dias?

Mãos à obra.



(big smile now, eat healthy!)