Notas para a análise da Universidade Privada em Portugal.
Parte 2 de 3
(ver índice aqui ou no final desta entrada)
II. CRUP - Opus Ensemble
No texto inicial do Cataláxia, menciona-se o Conselho de Reitores das Universidades Portuguesas (CRUP) como sendo "um poderosíssimo lobby de interesses pessoais, políticos e financeiros, que tem vindo a impor as regras de funcionamento do ensino superior em Portugal". A seu propósito, conclui que "o objectivo do CRUP foi sempre o de rebentar com as privadas, para as públicas não perderem os seus privilégios".
O CRUP é, na realidade, um centro de gestão de interesses e, ordinariamente, de gestão de crises. Fazendo, muitas vezes, jogo duplo, o seu fim, bem definido no Cataláxia, é conseguido através da ocultação, por todos os meios, da real face da Universidade em Portugal - no caso, a pública, mas com evidentes reflexos na privada.
Apesar de algumas excepções, hoje "na reserva", os membros do CRUP são a expressão máxima do feroz corporativismo docente do Ensino Superior público, contribuindo de forma ímpar para a manutenção da mediocridade do mesmo - tantas vezes de forma escandalosa, de tão evidente.
Este proteccionismo, do qual os contributos para a remodelação da famigerada Lei da Autonomia Universitária é um exemplo flagrante, tem levado a que as sucessivas reformas do Ensino Superior se tenham processado do topo para a base, pervertendo de forma irremediável todo esse processo.
Nada existe do lado discente que sirva de contrapeso à influência do CRUP junto do Estado - e não é colocando uns quantos quilos de papel higiénico no prato da balança correspondente que as anedóticas Associações Académicas vão lá.
A muito duvidosa qualidade dos sucessivos projectos para o Ensino, emanados do Ministério tutelar, e a descontinuidade e alteração radical dos mesmos, têm contribuído para que o CRUP permaneça incontestado e mumificado. Muito do que foi apontado sobre o mísero estado do Ensino Superior (público e privado) tem a chancela dos Reitores.
O Cataláxia, porém, evidencia um dos aspectos em que o CRUP tem razão na essência, embora não na forma, ao mencionar o "inferno" criado pelo Conselho de Reitores aos docentes que acumulam funções no Ensino Superior público e no privado.
Indica casos em que, "ganhando melhor e diversificando os seus interesses, muitos deles [docentes que acumulam funções em ambos os sectores] progrediram durante esse período, de forma assinalável, nas suas carreiras académicas e nas suas vidas pessoais".
Não duvido que o autor desta reflexão conheça casos assim, mas eu não tenho essa experiência.
A experiência que tenho, vivida na primeira pessoa e como representante dos meus colegas de Faculdade (que fui em todos os seus órgãos de gestão em que os discentes têm assento), é a de docentes que acumulavam funções em ambos os sectores a abandonar turmas inteiras no público para ir a correr dar as suas aulas "mais importantes" no privado; que nunca tinham disponibilidade para o tempo obrigatório de atendimento extra curricular aos seus alunos por terem de o fazer no privado; de rejeitarem projectos de Escola com incidência na sociedade por estarem a desenvolver projectos semelhantes no privado; que desprezavam a investigação por a fazerem em melhores condições no privado; que obrigavam os seus alunos do público a ginásticas incríveis para proporcionar os melhores horários aos seus homólogos privados...
O regime de exclusividade, em minha opinião, deve manter-se; mais, deve tornar-se de tal forma estanque que torne a sua quebra motivo de expulsão da docência, à imagem do que sucede com os advogados que quebram o seu código.
Ninguém consegue ser leal a dois senhores - fiel, talvez, mas nunca leal.
Quer o Ensino Superior público quer o privado necessitam da lealdade dos seus docentes. Partilhá-los é uma péssima forma de atingir tal desígnio.
Não é possível dar aulas no Porto e em Aveiro mantendo o nível de qualidade mínimo que é exigido a um docente universitário, que é, nunca o esqueçamos, a excelência.
Acumular funções, muitas vezes com sobreposição de horários, não resulta bem em nenhum caso - salvo em raríssimas excepções, mas não é em excepções que um sistema se deve basear, antes na norma.
A única coisa que progride, de facto, na vida dos docentes que acumulam funções na Universidade pública e no Ensino Superior privado, na proporção directamente inversa à progressão da sua qualidade como docente, é o seu saldo bancário.
Para um professor, universitário ou não, é uma progressão negativa.
Já o mesmo não se pode dizer dos mercenários...
(continua)
Índice deste tema, n'A Sombra:
1. Qual o Ensino Inferior? O público ou o privado?
2. CRUP - Opus Ensemble
2.a Anexo: Autonomia Universitária para que te quero!
3. Universidade e Emprego
nota. Considerações finais
March 22. Portugal.
Há 12 anos
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