sábado, setembro 20, 2003

Perfeccional


Ao passar o texto "Praxes", manuscrito, para o editor de texto, decidi alterar a palavra "adoração" por "idolatria"; isto é, pensava eu que o tinha feito.
O resultado foi uma aberração híbrida que já se encontra corrigida.

Aos puristas, entre os quais me encontro, e a todos a quem tal coisa soou estranha, as minhas desculpas.

nota:
Não, por acaso ninguém me enviou um reparo.
Eu é que sou perfeccionista. Infelizmente...

Confused?


Acabo de verificar que A Sombra, eu ou algum dos nossos bloggers está na mailing list do Partido Nacional Renovador (PNR)! Isto deverá tornar mais interessante o trabalho dos colegas do Carnivore, perdão, do DCS1000 * (hello boys!).

Suponho que isto vale uns pontitos no ranking do FBI.
Espero que para o lado certo!

nota:
E a quem devo o obséquio da entrada na lista do PNR?
Será a "vingança" do "Pedlo" Mexia? I wonder...

* DCS, Digital Collection System aka Carnivore

505 vs. 166600


O Luís Miguel tem passado pel'A Sombra mais do que A Sombra pelo Luís Miguel... Existem tantos blogs para ler que, por vezes, mesmo os que estão nos nossos links permanentes não merecem a atenção devida da nossa parte.
Pelo gosto que tenho na leitura do Musana, as minhas desculpas ao Luís Miguel por não o visitar mais amiúde.

Por contraste, tenho visitado outros que não deviam "roubar" tanto do meu tempo, mas que, pela sua complexidade e diversidade, se tornam mais demorados de ler.

Facto curioso:
Alguns desenvolveram uma autêntica paranóia pelos números dos contadores de visitas, que engordam a olhos vistos! O do Musana, porém, que deve encarar esse indicador de forma diversa, marcava umas modestas 505 visitas, a última vez que lá passei. Outros já ultrapassaram, largamente, a centena e meia de milhar. Um deles marcava, ao mesmo tempo que a referida contagem do Musana, 166.600 visitas. Não me impressiona. Sobretudo quando nele leio mimos destes:

--- quote ---

Nesta altura da noite, o Abrupto já foi visitado mais de 5700 vezes, um recorde absoluto desde que existe. Isto significa que muita gente veio hoje aqui pela primeira vez.

--- end quote ---


Já o Musana, escreve poemas.
Escreve sempre... O registo é familiar.

Luís,

Espero ler-te sempre e sempre encontrar leituras renovadas.
Como esta:

--- quote ---

Escrevo o medo

Escrevo o medo
No receio de ser preso
Na patologia decadente do verso

Escrevo o medo
No receio da insanidade
Trespassar a alma aberta

Escrevo o medo
No receio de mostrar
O sentimento oculto

Escrevo o medo
No receio de querer
Revelar o que não existe

Não ser puro

Ser apenas muro

--- end quote ---


Não "tenhas medo", Luís.
Como diria o meu amigo e poeta (sem o querer) Fabien (FJ):
"Mil vezes o peso da consciência própria à leveza da alheia! Libertai-vos!"

Um abraço para o Luís Miguel T. e desejos de rápidas melhoras para o JPP.

Encontro Nacional de Snailmail


Está marcado para o próximo dia 28 de Novembro de 2003 o primeiro encontro nacional de Snailmail (1).
Entre os presentes estarão notórios escritores de cartas, ridículas e não só, e representantes dos CTT (se ainda estiverem em funções, nessa altura).
O encontro terá lugar na Faculdade de Letras da Universidade do Porto (FLUP) e o custo de inscrição será o equivalente a uma franquia de correio azul nacional, para os participantes portugueses, ou internacional, para os estrangeiros. Ainda não está definido o desconto para participantes da Madeira ou de Porto Santo.

Os participantes usarão da palavra por ordem de inscrição, devendo apresentar a sua intervenção aos organizadores, obrigatoriamente manuscrita, como única condição para serem aprovados como oradores. Uma vez que eles próprios lerão os textos, a caligrafia não é factor de exclusão.

No local do encontro estarão disponíveis postos de escrita com o patrocínio da Rotring e da Winsor & Newton, estando assegurada a quantidade e qualidade de material de trabalho (instrumentos de escrita e suportes). Até este momento, não nos foi possível confirmar a presença de postos de escrita com os apoios da Montblanc e da Moleskine, mas estão a ser feitos esforços nesse sentido, para proporcionar aos participantes alguns postos State of the Art (topo de gama).

Os CTT ainda não confirmaram a oferta de sobrescritos, mas já deram luz verde para a instalação de máquinas de venda de selos. Na eventualidade do encerramento do posto de correios mais próximo da FLUP, os CTT comprometem-se a disponibilizar um posto móvel com todos os serviços, excepto fax e e-mail.

Mais informações, em breve, AQUI.


(1) Snailmail, ingl., literalmente "correio caracol"; alcunha do correio tradicional usada pelos utilizadores anglófonos de correio electrónico.

nota:
Isto a propósito disto.

A Abruptus o que é de Abruptus... Parte II


Assim, de repente, como que por um acaso, José Pacheco Pereira começou a identificar os excertos de imagens com que vai enchendo o seu blog...

Foi uma ideia genial.
Às vezes pergunto-me onde vai ele buscar a inspiração para estas coisas...

A Abruptus o que é de Abruptus... Parte I


Lido em Abrupto:

--- quote ---

Algum blogue relatou, ou comentou, a intervenção do Pedro Mexia sobre Pessoa, na Casa do dito?

--- end quote ---


Realmente, presunção e água benta...
Olhe, caríssimo Pacheco Pereira, comentei eu, por exemplo. E já estou a fazer mais que o devido ao colocar um "ping" no Technorati para que aqui chegue e um link neste parágrafo para que leia o que escrevi, se quiser.

Há cada um...

sexta-feira, setembro 19, 2003

Sem autorização


O poema de Fabien (FJ) abaixo, que publico sem o seu conhecimento prévio, constava de um e-mail que me enviou há uns dias e vem a propósito da sua última entrada.

Aguardemos a reacção. :)

Anjo Negro


Que faço aqui?
Eu que vi o fim do mundo,
Que me recordo de cada um
Dos castelos que deixei em chamas,
Dos desgraçados que fiz passar
Nas minhas lâminas,
Dos fetos que comi
E dos que dei a comer aos meus lobos...

Eu que vi os dois sóis vermelhos,
Que vi Hórus planando sobre o azul do sonho...
Eu que possuí princesas,
Que assassinei rainhas...
Que faço aqui,
Ainda...
Mata-me.
De uma vez, mata-me.


Fabien
Set'2003

Praxes


O mote foi lançado pelo amigo Baeta, há uns dias. Na altura, no próprio Local (e Blogal), prometi umas palavras sobre o mesmo. Aqui estão.


Praxe universitária:
a exclusiva integração.


Sou elitista.
A igualdade de direitos, deveres e oportunidades não pode ser confundida com igualdade entre indivíduos, coisa impossível de existir. A diferença entre "eu" e "o outro" vem do que eu e o "outro" fazemos dos nossos direitos, deveres e oportunidades. Existirão sempre os que atingem a excelência e os que medram na mediocridade, além dos que vogam entre elas, em ambos os sentidos.

Parte do que me leva a responder ao mote de António Baeta, sobre a praxe universitária, é a minha experiência pessoal, enquanto presidente da Associação de Estudantes da Faculdade de Belas Artes da Universidade do Porto (AEFBAUP), cargo que exerci nos finais do século passado (desculpem, mas não resisti!).
Numa época em que a luta pelos direitos dos estudantes estava ao rubro (em especial na AEFBAUP e na AEFA/UTL [1]), o papel político assumido frontalmente pela AEFBAUP - aliás intrínseco a qualquer AE em qualquer período - ocupou-nos a tempo inteiro, mas nunca descurámos o papel cultural que, também, deve ser o de qualquer AE, para mais uma ligada às artes.

Uma das vertentes desse papel, que tentámos explorar, foi a intervenção directa na chamada "vida académica", nomeadamente através do regresso das Belas Artes do Porto à Queima das Fitas. A nossa Escola, desde 1995 Faculdade, sempre foi frontalmente contra a praxe universitária ou "académica", mas não só - todos os aspectos da denominada "tradição académica" eram ignorados, desprezados e mesmo ridicularizados pelos "aspirantes-artistas". A tradição, em Belas Artes do Porto, era não existir tradição.

Convencido que uma instituição como a FBAUP não só podia como tinha a obrigação de intervir de forma activa e, sobretudo, edificante na vida académica, contribuindo para o instalar de uma atitude liberal, para a introdução de novos valores e conceitos diferentes na construção da mesma, assumi a reentrada da AEFBAUP no conjunto de Associações que realizam a Queima, corria o ano lectivo de 1998/99.
Lançado o desafio na Faculdade, logo surgiram interessados - muitos mais que esperava - e o processo teve início, mantendo-se activo até hoje. A AEFBAUP de então, apenas assegurava a logística e a manutenção do "bar" da própria associação no recinto onde eram realizadas as chamadas "Noites da Queima".
Resultado: nada de novo.

Eu, aliás, é que estava iludido, pois em termos de "tradição interna", nas Belas Artes do Porto, sempre se esteve na vanguarda, no tocante ao consumo de álcool, como comprovaram, ao longo de décadas, as suas célebres "Festas de Carnaval".
Ao integrar a Queima, a FBAUP assumiu, desde logo e com naturalidade, um dos lugares de topo em termos de adesão e intervenção. Só não no sentido que eu tinha em mente, quando iniciei o processo.
A FBAUP poderia ter sido um factor subversivo na "Queima", contra a apatia e a estupidez instaladas; poderia ter levado até ela a irreverência inteligente, a crítica oportuna, a sublimação estética. Mas não.
Fomos, apenas, uns bacocos iguais aos outros e, pelo que sei, assim tem permanecido a participação das Belas Artes na Queima, desde então.

Esta introdução serve para ilustrar como a mentalidade dos estudantes universitários, no exemplo concreto os da FBAUP, é medíocre, na maior parte dos casos. E como, também nesse caso, não é por convicção, mas por tradição (interna), que não existe praxe nessa Faculdade.
Enquanto presidente da AEFBAUP (mas também antes e depois disso) sempre me manifestei abertamente contra a aplicação da praxe na Faculdade, no que não tive oposição alguma e contando com o apoio tácito da Federação Académica do Porto, que sempre tolerou os "maluquinhos" de Belas Artes nesta matéria. Mas, e aqui já foi bem mais complicado, também nunca deixei de me afirmar contra o extremismo "antipraxe" de alguns sectores estudantis, internos e externos à FBAUP.

A confusão entre "praxe" e "tradição" académicas está instalada há muito. Desde que exista uma instituição, a sua tradição inicia-se imediatamente, sendo construída todos os dias. Qualquer Universidade tem tradições, sendo o traje uma delas, mas, em rigor, apenas a de Coimbra tem tradição de praxe.
O rosto mais visível desta confusão é, precisamente, a idolatria ou a alergia ao traje académico, hoje símbolo da praxe universitária, desafortunadamente. Conheço estudantes que usam o traje e são contra a praxe, ou seja, que a entendem como factor de inclusão, contrariamente ao de exclusão que é seu apanágio nos dias de hoje.

Recordo-me de ter comparecido a uma "reunião" de um suposto grupo "antipraxe", na Ribeira, no Porto, a que compareci com uma colega de Belas Artes trajada a rigor (!). Foi um escândalo.
Entre cochichos e olhares de soslaio, só esse facto atrasou o início da "reunião" uma boa hora e meia, incluindo tentativas de "despistagem" por vários bares, na expectativa de nos verem desistir da participação. Quando, finalmente, começaram os "trabalhos", a intervenção inicial foi dedicada à nossa "delegação" em termos, digamos, deselegantes.
Aberto o precedente, considerei-me esclarecido (e mais ainda a minha companhia), usei do "direito de resposta" para mandar aqueles ilustres "antipraxistas" à merda e escoltei a minha amiga até sua casa. Estava encerrada mais uma experiência edificante.

Bem vistas as coisas, e em bom português, os "antipraxistas" inspiram-me tanto asco como os "praxistas". A dita "praxe" continua a ser um motivo de intimidação e de exclusão, aplicada segundo métodos bárbaros, que reflectem quase só o desejo de retribuição mal disfarçado e as frustrações de "praxistas" e de "praxados" por igual (e o meu desprezo pelos segundos excede largamente o que sinto pelos primeiros). A praxe encontra-se totalmente esvaziada do seu suposto papel integrador e, em especial, de inteligência.
No outro campo, o dito "antipraxe", dão-se vivas ao Zapatismo - e não preciso acrescentar mais nada.

Com o nível cultural que existe entre discentes e docentes nas nossas Universidades, não vejo como um ou outro campo consigam ultrapassar as suas limitações. E tão limitadas são, que transformam o que poderia ser um ritual iniciático reservado a um ou mais círculos interiores, afastados do vulgo académico e da praça pública, num circo insano e idiota à vista de todos, em que qualquer um pode ser doutor ou engenheiro, desde que lhe vão ao traseiro. É este o "escol" da Academia.

É como se, no século XIII, todos os católicos romanos pudessem ser Templários... Afinal, não somos todos "iguais"? Não teremos nós todos o direito de levar um beijo no cu?

Rui Semblano
Porto, 19 de Setembro de 2003


[1] AEFA/UTL, Associação de Estudantes da Faculdade de Arquitectura da Universidade Técnica de Lisboa. A AEFBAUP e a AEFA/UTL foram, até hoje, as duas únicas Associações de Estudantes a darem início e consequência a processos de Sindicância (ver Linces II).

Aflições


O Jaquinzinho está aflito!
Compreendo-o perfeitamente.

Caro Johnny,

Dirija-se AQUI e força! Estou consigo!
Não hesite. Verá como se livra dessa aflição que é partilhar a nacionalidade com Maria João Pires e outros incultos lusos. Com um antecedente como o Jaquinzinhos, não deverá encontrar grandes dificuldades em ganhar a lotaria.
Depois escreva! Diga-nos como é.

Um abraço,
RS

N'importe quoi...


Pedro Mexia afirma a influência de (algum) Pessoa na sua formação, e escolheu isto para o ilustrar.
A poesia é, de facto, um prodígio.

Blogomania


O Jornal de Notícias (18-09-2003, p.1, 2 e 3, "A blogomania nacional") dedica honras de primeira página ao fenómeno dos blogs em Portugal, a propósito do encontro nacional sobre Weblogging que se realiza a 18 e 19 deste mês, na Universidade do Minho, em Braga.

Trata-se, segundo o JN, da "última moda de comunicação pela Internet" e, para falar sobre ela, estarão em Braga alguns dos "incontornáveis", como António Granado (Ponto Media), José Mário Silva (Blog de esquerda) - que, afinal, não poderá estar presente - e José Pacheco Pereira (Abrupto). Vão estar bloggers ligados ao jornalismo, para falar sobre weblogs e jornalismo, e estarão bloggers "comuns", para falar sobre weblogs "na generalidade".
Parece um congresso e, se calhar, é mesmo.

Antes de conhecer este encontro já o Crítico me tinha chamado a atenção para um outro, a realizar em Outubro, em Lisboa; este mais íntimo, menos "congresso"; mais "restaurante", menos "universitário". Não sei se irei a Lisboa, em Outubro. Sei que ontem não fui a Braga e que, também, lá não irei hoje.

A Blogosfera é um mundo virtual, onde a realidade existe a par com o sonho, a possibilidade a par com o impossível. Ainda assim, o seu papel não se esgota em si mesmo (longe disso) e a maior parte dos assuntos nela tratados e retratados (será mesmo a maior parte?) é bem real.
No meu caso, que nunca dispensei a escrita - escrevo este texto com o negro do costume, sobre o habitual papel branco liso de um caderno mais - , trata-se de uma extensão natural da mesma; de uma abertura do caderno de forma inconcebível, fora do contexto virtual da Blogosfera.

Amante da troca de opiniões e da eterna demanda que é a busca da verdade, nunca deixarei de discutir ideias pessoalmente - em oposição ao bartoon de Luís Afonso; e há muitos assim - sejam os meus interlocutores bloggers ou não, mas fazê-lo numa perspectiva de "congresso" causa-me sérias dúvidas.

Qualquer dia ainda vão propor a criação de um grémio para bloggers (ou de uma "guilda", já agora!) ou de sindicatos que defendam os seus interesses... Lamento, mas não me parece que seja por aí.
Aliás, como diz o JN, isto não passa de uma moda "sem interesse comercial" (não existe sexo ao vivo, apesar dos esforços insanos do "Pipi"); e eu, que nunca fui em modas, que não imagino o destino desta Sombra, permanecerei o que sempre fui: eu.
Se na Blogosfera ou no caderno onde escrevo neste momento (como escrevo desde os meus 17 anos) não faço ideia.

Apenas sei que sempre continuarei a escrever.
E que "congressos" dispenso-os bem.

quinta-feira, setembro 18, 2003

Fernando Cameira (1957-2003)

in memoriam

Dei pelo Fernando Cameira quando soube da sua morte.
Não o tinha lido antes, nem conhecia a sua pintura ou a sua música. Era mais um desconhecido; mais um "outro", daqueles que tento respeitar sem sequer conhecer. A última entrada, no seu "blog do veneno eficaz", não é sua, mas de Lia Cameira, sua esposa e discípula, como se afirma.

No registo do Fernando, alguns links para outros blogs, poucos, do lado direito, ao cimo... Uma entrada final lapidar, de sua autoria, que nunca saberei o quanto adivinhava do futuro... Palavras. Ligações para outros registos seus, onde vi as fotos do seu filho, o Sérgio, da sua companheira, a Lia, e da "Paprika", a sua cadelinha rafeira...
Vi o que ficou para trás como se de mim se tratasse. Apenas posso julgar que foi o cancro que venceu o Fernando, pelo que li, mas que importa? A sua vida entre nós foi interrompida, como poderá ser a de qualquer um, a qualquer momento.

Os registos do Fernando emocionaram-me mais do que julgava. Talvez por se tratar de "um de nós", os que escolheram a Blogosfera para partilhar ideias, trocar ideias, falar de ideias. Mas não só.

Emocionou-me o modo suave com que se apresentava, com que falava dos seus entes queridos e do seu trabalho. Emocionou-me a forma como descreveu as dificuldades em fazer compreender Portugal que a Lia era sua esposa e que não a podia perder em qualquer circunstância, mas para mais naquela em que se encontrava. Emocionou-me o seu apelo aos que o liam para o ajudar e ver o zero nos comentários desse pedido de ajuda. Emocionou-me cada rótulo de "vendido" junto aos seus trabalhos de 75 ou 100 euros... Retalhos de um homem a 100 euros... "Vendido". E ainda há alguns à venda; agora retalhos da sua memória.

E emocionou-me a coragem da sua companheira, que lhe faz honra.
Para ela e para o Sérgio não tenho palavras. Não posso ter.

Para nós tenho algumas, ainda. Para os que escrevem, sobretudo. Para os que o fazem no mesmo registo do Fernando Cameira, em especial. Para os que sabem que, um dia, as suas palavras escritas vogarão perdidas por este espaço, esperando uma leitura improvável... Impossível. E escrevem.
E escrevem...

Na louca esperança de diminuir a improbabilidade do encontro das palavras do Fernando, aqui coloco um elo de ligação para elas. Para que, um dia, o improvável, o impossível leitor das minhas possa encontrar as dele.

No limite, restam as palavras.


Rui Semblano
Porto, 18 de Setembro de 2003


O último registo do Fernando Cameira
em Blog do veneno eficaz:

8/27/2003
nada a provar
Nada a provar nada a negar. Pensar. Pode ser interessante ler mas muito também o experimentar. Pensar sem medo e reflectir sobre esses pensamentos, construir teses sem vergonha do que os outros pensem. Pode ser que se abram novas portas e outros mundos assomem…
# posted by fernando : 7:17 AM


Ele e os seus
A sua arte
A música

Lástima...


Acabo de receber este e-mail do Nicolau...

--- quote ---

Caros «Pyotr», Rui Semblano e «Poeta»

Umas palavras de justificação, dada a simpatia com que me acolheram e o
apreço que tenho pela v. escrita. Decidi fechar o Tolentino. Arrependi-me de ter iniciado esta experiência, que comecei um pouco por desfastio, um pouco porque estava cansado da escrita séria e contida. Vistas bem as coisas tenho de considerar que para escrever sobre os outros, os tenho que ler. Ora isso aproxima-me de um tipo de pensamento e de afecção que sempre recusei. Um médico pode tratar da tuberculose sem ter de ser tuberculoso. Mas na escrita é diferente, e acabaria «tuberculoso» se continuasse a ler o que tenho lido nestes dias. Chega, portanto.
Se vos escrevo é porque não os incluo nesse bando; para mim fazem parte da «zona libertada» do mundo. Outros haverá, mas não tive tempo para os conhecer melhor.
Como vou pura e simplesmente apagar o blog, agradecia que um de vocês publicasse este mail, para encerrar o assunto e acabar com as visitas. Se não publicarem, tudo bem também..
Bom trabalho!


«Nicolau Tolentino»

--- end quote ---


Caro Nicolau,

É com pena que o vejo tomar esta atitude, embora não só a respeite como a compreenda. Espero que reencarne em breve num vulto cultural que não o obrigue a ler tanto do que nunca deveria ter sido escrito, permitindo-lhe o prazer da escrita e, a nós, o da leitura.
Gosto de "Nicolau". Se regressar, um dia, porque não adoptar um heterónimo que o assimile? Como o do edificador de Príncipes, por exemplo.

Bem haja pelos poucos mas bons momentos que nos proporcionou e que encontre o que procura, são os nossos desejos sinceros. Até sempre.

Pel'A Sombra,
Rui Semblano


nota:
Atrevo-me a sugerir que não apague o Tolentino.
É um marco, afinal. Pequeno ou grande não importa.
Fez parte da blogosfera.
E a si dedico a entrada acima direccionada em "Príncipes".
Um abraço.

nota2:
Não é, de todo, nosso hábito publicar menções honrosas ou desonrosas enviadas à Sombra nas suas páginas, mas, para mim, o pedido de publicação integral do e-mail do Nicolau não deixava margem de manobra.
Ou o publicava todo ou não. Já está.

Escolhas


O Valete Fratres! traduziu parte de um artigo que produz pertinentes considerações sobre o 11 de Setembro de 1973. É um artigo bem elaborado sobre os motivos que levaram à queda de Allende, mas não se fica por aí.

O Valete, no entanto, fica.
(embora remeta para o artigo original em castelhano)

Para que o quadro fique completo, aqui fica, apenas, a última parte do artigo em questão, da autoria de Lorenzo Bernaldo de Quirós:

--- quote ---

(...) A intervenção militar [de Pinochet] foi resultado de uma rebelião civil e parlamentar perante a deriva do regime da Unidad Popular para o totalitarismo. Allende tinha, à partida, uma limitada legitimidade que destruiu mediante um exercício inconstitucional do poder.
O resultado foi a entronização de um longo, injustificável e doloroso período de autoritarismo militar com uma legião de cidadãos exilados, presos e torturados [1]. Assim, Salvador Allende não reúne as condições para figurar no santuário ou no martirológio da democracia chilena, como alguns pretendem, pois liderou um projecto cujo final teria conduzido de forma inexorável à destruição do sistema democrático no Chile.
A sua morte trágica merece compaixão pelo homem, mas sobretudo pelo país que o seu sectarismo afundou na noite negra da ditadura; nunca mais um Allende nem nunca mais um Pinochet.

(Lorenzo Bernaldo de Quirós é presidente do Freemarket International Consulting em Madrid, Espanha e académico associado do Cato Institute)

--- end quote ---


([1] Não menciona os mortos. Por pudor?)

Percebe-se, pelas passagens eleitas pelo Valete, onde quer este chegar. Também se percebe onde Lorenzo de Quirós quer chegar. O seu texto aponta o desviante adoptar das máximas marxistas da destruição do Estado democrático e da sua estrutura sócio-económica para que das suas cinzas nasça o socialismo, que foi apanágio da administração de Salvador Allende. Aponta mesmo o espectro soviético, decidido a invadir toda a América do Sul via Chile. Faz uso de uma afirmação da revista The Economist de 13 de Setembro de 1973, que dizia: "A morte transitória da democracia no Chile será lamentável, mas a responsabilidade directa pertence claramente ao Dr. Allende e aos seus seguidores que atropelaram a Constituição." Em 1973, dois dias após o golpe militar no Chile, a The Economist não tem dúvidas, mas em 2003, 30 anos depois, já não sabe o que pensar.

Eu sei o que penso.
Penso que Lorenzo de Quirós justifica uma acção militar para derrubar um Governo legítimo através de uma série de catástrofes que este estaria prestes a cometer no futuro. O mesmo condicional de sempre... O Iraque também estaria a desenvolver armas formidáveis que poderiam ser activadas em 45 minutos e que seriam apontadas ao "mundo livre".
Saddam Hussein nada tem a ver com Salvador Allende, excepto o ter sido vítima de uma acção preventiva com vista a impedir o que se julgava vir a acontecer no futuro.

Prevenções não me agradam nada, venham de onde vierem, ou qualquer dia temos os militares portugueses a entrar pelo parlamento dentro, com ou sem o apoio de terceiros, porque tudo indica que o Governo português nos vai levar à desgraça e, afinal, seria assim legítimo que alguns iluminados o removessem. A bem da nação.

Enquanto um Governo legítimo for soberano, ou se respeita e se aguarda que demonstre ser uma catástrofe para agir radicalmente ou caímos na tragédia que é provocar uma catástrofe certa para evitar uma que poderia, eventualmente, ter acontecido. Afinal o que sucedeu no Chile. E no Iraque.

Não, obrigado.

Free at last


Verificamos com agrado que o Tolentino transferiu o link d'A Sombra da sua lista geral de links para o que denomina por "Zona Libertada", onde ele próprio se inclui.

Ora aqui está um exemplo de como, sem rótulos, se pode classificar a nossa atitude face à vida e, necessariamente, à blogosfera, por oposição aos que tantas etiquetas e carimbos teimaram em nos colocar... sem êxito.

nota:
O Nicolau, julgo que por opção, não disponibiliza o identificador de cada entrada que faz, pelo que não nos é possível direccionar os interessados para aquela a que nos referimos, neste caso publicada a 18Set2003, com o título "À sombra da sombra".

quarta-feira, setembro 17, 2003

Ídolos


A propósito do artigo de Joaquim Fidalgo, no Público de hoje,
intitulado "Ah!, Valentes...":

1.
Uma vez perguntaram-me quem eram os meus ídolos.
Assim, de repente, talvez o Lancelot, talvez o Ajax... - respondi, que nunca tive dos de carne e osso. Olharam-me como se fosse um extraterrestre e revidaram: O Lancelot é um clube inglês?

2.
Hoje, por acaso, encontrei o Joaquim Castro Caldas num café onde param Siza Vieira e Gustavo Bastos (que também lá encontrei e me atirou um isqueiro aceso em resposta à minha mão estendida!). Nem de propósito, pois ainda hoje o referi aqui, por falar em poesia.
Digo-lhe para se sentar e tomar um café comigo, ao que ele sorri, respondendo que, certa vez, em Paris, Samuel Beckett fez-lhe idêntico convite.
Eu não sou o Beckett, mas o Joaquim será sempre o Joaquim.
(E, desta vez, talvez o vá ver ao "Maus Hábitos", no Porto, dia 23)

RTS

(*)

Não metapolemizemos, Fab. :)
Mas quase te via escondido, prestes a saltar! Assim como à espera que acabasse de o fazer para atacar. Daqui não levas nada (lol) - se é uma batalha virtual o que procuras, tenta aqui.

Estou certo que encontrarás no "periférico sem fios" descrito pelo Pessimista um adversário à altura. Quanto a mim, vou descansar.

À demain.

(*) RTS, Real Time Strategy - Estratégia em Tempo Real

Bendito Tolentino


Já há muito não me acontecia ficar agarrado a um blog e como este, embora de outra forma, só mesmo "O meu Pipi". O Tolentino fez a gentileza de colocar o link para A Sombra entre os que constam da sua longa lista; como prometido, preparava-me para retribuir a gentileza em sede própria, para já, quando comecei a ler.

Mas o que eu fui fazer!
O que me valeu foi ser o Nicolau um recém-nascido em termos blogosféricos, apesar dos seus vetustos 263 anitos; caso fosse mais velhinho neste campo, ainda lá estaria a esta hora, em vez de estar aqui a escrever que decidi, após óptimos momentos lá passados, colocar o Tolentino na nossa lista permanente de Blog Links, aqui ao lado.

Um abraço de boas vindas ao Nicolau Tolentino!
A blogosfera satírica entra em outra dimensão!

nota:
Sempre desejei escrever sobre um pintor português do século XVIII!
Obrigado, Nicolau.

nota2:
Claro que tudo isto pode ser para evitar que o Tolentino caia sobre A Sombra com a sua pena afiada, mas, como sei que o faria de qualquer modo, optei pela fórmula habitual: dizer o que penso. ;)

Lucky Luke


O Pedro Mexia entendeu dar uma resposta à minha entrada "Assobios", ao fazer uma nova ronda pelos blogs que comentaram a sua decisão de alterar o rumo do seu Dicionário.

O modo como escolheu responder demonstra que, afinal, o "Diabo" permanece, o que, junto com a promessa de "diabruras" condignas no novo formato do seu blog, parece indicar que existirá "vida para além da morte" do Dicionário a que estava habituado. Continuo a lamentar a decisão do Pedro, pois se tudo é política, falar de política ela mesma continua a ser um dos temas que apaixona a blogosfera, como oposto à apatia do "mundo exterior". Nesse sentido, reafirmo que estamos perante uma perda.

Nunca li o "outro" Pedro Mexia, embora seja apaixonado pela poesia.
Fica a promessa de o fazer em breve, pois não é sempre que se dispõe de um meio assim para se conhecer alguém um pouco melhor. Mas, se o tivesse lido antes, teria sido mais ou menos incisivo com ele?
Do pouco que o conheço, reconheço uma das características do poeta: a paixão. Nesse aspecto, seremos mais parecidos do que eu próprio julgo. Desse parco conhecimento, porém, me pareceu claro que a minha abordagem dos seus textos não seria interpretada como insultuosa, mas sim como conflituosa. Penso que foi assim.

(A julgar pelo calibre de algumas das suas entradas, Pedro, convirá que, sendo eu como sou, não poderia ser de outra forma.)

A sua resposta, por si, não valeria uma radical mudança de atitude da minha parte, embora valha o meu reconhecimento da dignidade do Pedro, mas existirá algo mais, talvez. Existirá uma mudança que confirma a regra que apontei na entrada a que Mexia respondeu, que fala de "primeiras impressões". Essa mudança encontrar-se-á, porventura, num texto "muito longo, sim" que o Pedro publicou há pouco, motivado pelo passar de onze meses sobre o fecho da Coluna Infame.

Nesse texto se encontra um pouco do "Diabo" que Mexia quer mudar, mas em vão. E é nele que encontro um bom pretexto para lhe colocar um epíteto novo, demitindo o de "demissionário". Tem ele a ver com uma característica que aqui lhe atribuí há tempos: a de fazer "click" em "publish" muito rápido.

A partir de hoje, n'A Sombra, O Dicionário do Diabo tem uma nova qualificação nos nossos Blog Links. Um caso típico de epítropia! :)

Ao "Diabo" (que, afinal, parece não será nunca um "diabito") envio um abraço desde A Sombra, assegurando-lhe que de mim nunca merecerá nada abaixo de "embirração", pois não o merece.
A ser assim, já há muito teria deixado de o ler.

Rui Semblano
Vila Nova de Gaia, 17 de Setembro de 2003

Os Vizinhos


A chegada do Barnabé à Blogosfera tem merecido a atenção de variados blogs e, agora, merece a nossa, já iniciada com a entrada de Fabien, mais abaixo. Avessos que somos a contagens de espingardas ("canhotas" ou "direitas"), aqui deixamos um abraço de boas vindas (embora tardio) aos "Barnabés". Em boa hora - e não por serem assumidamente "de esquerda", mas pela mais valia que, do pouco que conhecemos, trarão a este universo; pelo que trarão de enriquecedor, no sentido lato de liberal.

E agora, a minha primeira "turra" (em "linguagem felina"):

Não direi os "Barnabés", embora seja natural, do que conheço deles, assumir que partilham a mesma opinião, mas pelo menos o Daniel Oliveira advoga o equilíbrio da política internacional apoiado em outros meios que os militares (ver "Europa, uma potência?", no Barnabé).

Estou plenamente de acordo que assim deveria ser.
A diplomacia deverá encarregar-se de repor o equilíbrio e a ordem no sistema político mundial. Além de refrear os ímpetos pseudo-imperialistas de algumas nações (os EUA são o caso mais flagrante e preocupante, mas existem candidatos a "mini-imperadores" em quase todos os cantos da Terra), a diplomacia deve impor o respeito pelo Direito internacional e arbitrar e julgar as inevitáveis tendências desviantes da globalização, eliminando o "Neo" e retomando o "liberalismo" no verdadeiro sentido, retirando o excessivo interesse de alguns em favorecer os países ricos, que sempre irão lucrar mais do que os pobres - numa fase inicial - com qualquer modelo de globalização. Entre muitas outras coisas, a diplomacia deverá solucionar estes conflitos de interesses, interferindo nos respectivos processos, seja qual for o campo em que se desenrolem.

Os problemas encontrados pela diplomacia nestas áreas, e ao falar em diplomacia a este nível é da ONU que falamos, estão nas acções que dela são exigidas e que atrás menciono, com destaque para as de "repor", "refrear" e "impor".
Isto porque o ser-humano é muito mais que imperfeito; é torpe, mesquinho, egoísta e, sobretudo, essencialmente malévolo. É esta a nossa natureza - e, desde logo, a minha e a dos "Barnabés", por mais que a reneguem com o máximo de sinceridade, afirmando a sua civilidade e bom senso. Tretas.
Nas condições certas, qualquer ser-humano é tentado a ser Deus.

O que nos impede de sermos assim, todos terríveis, uns para os outros?
A educação, em primeiro lugar, quando é bem dada, pois aqui ou nos confins da Galáxia, religiões à parte, deve ser baseada no respeito pelo outro como condição de se ser respeitado. Mas as educações variam (e "avariam") e, ainda que todos fossemos bem formados, os "feitios" também. Não existem duas personalidades iguais, mas existe um mínimo denominador comum a todos os seres-humanos: o egoísmo. No outro extremo, já não comum a todos, encontrar-se-á o amor, talvez.

Em condições normais, do quotidiano, o que impede o meu vizinho de colocar o seu lixo à minha porta? Duas coisas: a sua boa educação e, no caso desta não existir, a minha "cara de poucos amigos" (as pessoas acham que tenho "cara de poucos amigos"... é a minha sina).
Um vizinho meu poderá ser muito mal educado, mas quando olha para a minha porta, com o saco do lixo na mão, e se recorda da minha cara e do que ela pode significar, pensará que o melhor será dar mais uns passos e colocar o lixo no seu devido lugar.
O mundo é feito de vizinhos; uns bem educados, outros nem por isso. Aos bem educados serve a diplomacia, aos que não o são, não.

Nada nos garante, aliás, que um vizinho outrora civilizado mude de atitude, transformando-se num meliante - e pouco importa se foi por causa da esposa, do patrão ou de outro vizinho - se o deixarem, ele vai infernizar a vida dos que nele depositaram a sua confiança, anteriormente. Se sentir que o pode fazer, passará por cima de tudo e todos para conseguir o que quer (seja lá o que isso for) e melhor o conseguirá se puder abusar dessa confiança dos tempos de "bom vizinho".

Existem muitos "maus vizinhos" neste mundo. Sempre existiram. Neste momento, o pior de todos eles chama-se Estados Unidos da América. E é o pior porque tem todas as razões e os meios para ser o melhor vizinho de sempre, mas usa-as de forma menor, transformando-as em instrumentos de discórdia e deixando-se embriagar pela soberba. A humildade nada acrescenta aos fracos, pois é sua condição. Apenas aos fortes ela assenta como o coroar da magnanimidade e da sabedoria.

O Daniel Oliveira parece-me ser um verdadeiro pacifista, no sentido que uma vez o Adeodato se referiu a mim. Não o sou. Manifestei-me publicamente contra a invasão do Iraque (quem sabe ao lado do Daniel), mas não contra "a guerra". Compreendo e respeito a atitude, mas nela residem perigos graves e, por isso, não a defendo. Porque ser contra a guerra, em si mesma, implica ser contra os exércitos, contra o serviço militar, contra o investimento na Defesa (que, n'A Sombra, sempre será apenas e só a Defesa), contra todo o tipo de violência, seja porque motivo for. Talvez a diferença entre a postura de um verdadeiro pacifista e a minha seja que ele vê em Ghandi a libertação da Índia e eu vejo a criação do Paquistão.

O ser-humano não é um anjo azul, nem cor de rosa. O ser-humano é um demónio negro mal contido por uma ou duas (por vezes três) camadas de envernizada civilidade. Confrontados com a morte, com a oportunidade de subir na vida (seja de que modo for) ou, de um modo geral, com uma situação limite em que se tem de escolher entre "eu" ou "o outro", principalmente se este outro for anónimo, poucos seres-humanos revelam... humanidade.
O 11 de Setembro de 2001 revelou o que de melhor existe em nós, através do sacrifício dos que deram a vida tentando salvar completos desconhecidos, mas temos que ser realistas. Foi uma excepção, como o foram outras poucas, no meio do turbilhão de egoísmo e barbaridade que antecedeu e que se seguiu a esse momento.

Imaginemos isto:
Que os EUA não têm ambições imperiais; que não querem a supremacia económica e financeira; que as suas forças armadas são apenas razoáveis e aptas à sua defesa ou nem isso; que são os primeiros a apoiar a ONU e a defender o Direito internacional; que ratificaram Kyoto e o TPI e implementam ambos mais a não proliferação de armas nucleares.
Imaginemos agora:
Que o presidente "desses" Estados Unidos pede a Israel para alterar a política que vem seguindo para os territórios ocupados desde 1967 e regresse às suas fronteiras como definido pela ONU.
E, nesse caso, não precisamos de imaginar:
O Knesset em peso a rir à gargalhada durante semanas...

Dada a natureza humana, a diplomacia será sempre apoiada em relações de força - económica e militar (garante da primeira, não esqueçamos).
Pensar o contrário é compreensível, é um desejo bonito, é sinónimo de tolerância e maturidade moral, é simpático... e é irresponsavelmente perigoso.

Durante as conferências que decorreram este ano na Cooperativa Árvore, sob o título "O desconserto no Mundo", tive oportunidade de confrontar o professor Adriano Moreira (15Mai2003) com uma questão que agora escolho para fazer ao Daniel Oliveira (e a outros dos "Barnabés" que queiram responder-lhe, naturalmente):

Acha bem que sejam os EUA, ou qualquer outro terceiro, a garantir a segurança da União Europeia? Não acha que a União Europeia deveria ser capaz de se defender sem depender de terceiros? E continuando a depender de terceiros para esse fim, não acha que não faz sentido falar de soberanias dos Estados da UE, que tendem para a soberania da própria UE nas suas questões internas?

Após receber notícias do Barnabé, revelarei as mesmas junto com a resposta que mereceram de Adriano Moreira.

Ao Daniel e a todos no Barnabé um abraço.

Pel'A Sombra,
Rui Semblano


nota:
A entrada de Fabien, que menciono acima, peca por excessiva paixão, um defeito que revela na análise dos textos ditos "de esquerda" e que em mim se revela mais na análise dos ditos "de direita" (que o diga o Pedro Mexia...).
Foi, no entanto, graças a ela que descobri o Barnabé e a entrada que ele refere e que motivou esta da minha parte. (Espero não iniciar uma nova metapolémica sombria com FJ)...

terça-feira, setembro 16, 2003

Novidade


Ao longo da existência d'A Sombra, temos merecido a atenção de outros blogs que, infelizmente, ainda não exploramos o suficiente. Também temos referido blogs que mereceram a nossa atenção, mas não o suficiente para destronar algum dos que constam na nossa lista de Blog Links permanentes.
(à direita)

Uma vez que a reciprocidade, embora simpática, não diz nem com qualidade nem com conhecimento, dois factores essenciais à colocação de um novo link na nossa lista de permanentes, o facto de nos colocarem um link em outro blog não implica (nem implicará) um gesto idêntico da nossa parte.

Dada a apertada grelha dos nossos links permanentes (onde não entra mesmo toda a gente) foi criada uma página onde estão listados todos os blogs que, de algum modo, estão relacionados com A Sombra, independentemente dos seus outros méritos (ou deméritos). Para nós é útil; para os que nos visitam pode ter interesse; para os que nos referenciam será uma forma de retribuição, sem alterar o nosso código de conduta na blogosfera.

O link para esta página encontra-se em último lugar na nossa lista permanente de Blog Links, com a denominação "Relações Sombrias" - umas boas outras nem tanto, mas todas relativas à Sombra.

nota:
Dado o trabalho que esta novidade deu, não colocarei mais entradas n'A Sombra, esta noite; mas durante o dia de hoje haverá tempo para isso.
Bem mais logo. :)
Boa noite a todos.

segunda-feira, setembro 15, 2003

Refutações augustas


Já esperava que, um dia, me chamassem de "direita", mas não estava à espera que lhe adicionassem "extrema", nem tão pouco que o fizessem nas páginas de um jornal, no caso o Público.

--- quote ---

Seria ingénuo inferir da longevidade de Leni Riefenstahl, que 58 anos sobreviveu ao seu amado Hitler, que as questões extremas que a sua vida e obra suscitaram estivessem apaziguadas. São questões cinematográficas, imagéticas, políticas e talvez sobretudo éticas cruciais - não se lhes pode ser indiferente. E por mim não consigo também ficar indiferente quando verifico que a circunstância da morte é razão de um elogio tão apaixonado e "branqueador" das conexões nazis como a carta de um leitor no PÚBLICO de sexta-feira. E por isso também não posso ficar indiferente a dois textos: o de José Manuel Fernandes no PÚBLICO de quarta-feira e o de João Lopes, no "Diário de Notícias" de ontem. (...)

--- end quote ---


(Augusto M. Seabra in Refutação de Riefenstahl, Público, 14Set2003, p.8)

Caro Augusto M. Seabra,
(Posso tratá-lo assim, não posso? É que não me soa bem chamar-lhe "um colunista do Público" como equivalente ao seu gentil "um leitor (do) Público" com que me identificou no seu artigo)

Antes de mais, costumo estar no seu comprimento de onda, pelo que fiquei desapontado pela forma como escreveu e, sobretudo, intitulou o seu artigo.
Refutar Riefenstahl?
Esperava outra coisa de si, que o refutar de algo que (quase) todos refutam vai para mais de 58 anos. Sim, mais. O Augusto M. Seabra sabe tudo sobre Leni Riefenstahl e como amava o seu Fuehrer, mas escolheu ignorar que o mítico "Triumph des Willens" ganhou uma medalha de ouro na Feira Mundial de Paris de 1937. Claro que os franceses acordaram em 1939 e mais ainda em 1940. Como vê, Leni é refutada vai, pelo menos, para 63 anitos. Mas faltava a sua refutação. Claro.

Recusa-se a comparar televisão a arte cinematográfica?
Faz muito bem. Mas olhe que comparar "Triumph des Willens" ou "Olympia" ao "Big Brother" ou à "Volta a Portugal em bicicleta" não abona muito em favor da sua afirmação.
A sua afirmação de outro génio, Serguei Eisenstein, e a invocação da sua obra máxima (para mim) "Aleksandr Nevski" - feito uns três anos depois de "Triumph des Willens" - como exemplo de... de quê?, só revela que é incapaz de dissociar Arte de política.
A "senhora intentou o embelezamento do mal"? "Do Mal absoluto"? Não devemos estar a falar da mesma Leni Riefenstahl. Aquela de quem eu falo não intentou embelezar o mal. Conseguiu-o. E conseguiu-o de forma superior e absolutamente inatingível.

Um artista, Augusto M. Seabra, não é um político. Em boa verdade, um artista está-se a marimbar para tudo o que não seja a sua arte, mesmo que isso signifique um pacto com o Diabo. Ou entende a Arte como um serviço público? Se assim é, desengane-se. Um artista trabalha para si mesmo. O que busca não é a satisfação dos que observam o seu trabalho, mas a apaziguação - ou a exaltação - dos seus demónios interiores. Veja a Maria Callas, por exemplo, que nunca teria lido uma linha escrita por si sobre ela nos jornais, caso tivesse sido seu contemporâneo e colunista da altura.

A verdadeira arte não tem compaixão por terceiros. Vive. Augusto M. Seabra não gosta de Leni Riefenstahl; é legítimo. Mas que exalte esse desgosto em página inteira no Público é mais complicado. Deveria escolher alvos mortais para as suas crónicas, normalmente bem apanhadas.

É que, francamente, no Olimpo ninguém lê jornais.
Sabia, Augusto?

Rui Semblano
Porto, 14 de Setembro de 2003

nota:
Diz do meu texto que é "apaixonado" e "branqueador". Não está mau. Percebeu metade do que leu. A mim saber qual delas corresponde ao espírito com que o escrevi. A si, se quiser, descobrir a metade que percebeu mal.

(carta enviada ao jornal Público em 15-09-2003)

domingo, setembro 14, 2003

Amadeo 2003


4º Prémio Amadeo de Souza-Cardoso
Museu Municipal Amadeo de Souza-Cardoso (MMASC)
Amarante - 13Set2003 a 02Nov2003

Vista a selecção exposta no MMASC, o que pensar?
Em primeiro lugar, dada a qualidade dos trabalhos expostos, que nem tudo vai mal na Arte em Portugal. Podia sempre ser muito pior, pelo que não faz sentido ir por aí. Mas faz sentido fazer algumas perguntas.

Porque motivo nomes como António Drumond, António Quadros Ferreira ou Jaime Isidoro, entre outros, concorrem a este prémio?
Recorda-me a dúvida sentida perante a notícia inicial do DN, que entregava o prémio deste ano a Júlio Pomar. A procura de novos valores é incessante, mas inclui a procura de mais valor em valores já confirmados? Ou não serão eles valiosos que baste?

Que a escultura tenha lugar neste prémio é razoável, mas a fotografia? E a serigrafia? Os processos mecânicos como método de realização artística são considerados ao nível da pintura e da escultura? Em 2005, posso concorrer com uma impressão digital de um trabalho feito em Photoshop? É que não percebo nada de pintura, mas a minha impressora percebe.
(E, sendo assim, em caso de prémio, é ele para mim ou para a Adobe ou para a Hewlett Packard?)

E como é possível que uma obra vencedora, a de Ana Vidigal, seja apresentada com evidentes sinais de deterioração e estrago? A artista sabe? Foi ela que estragou? Foi o museu? Foi por isso que ganhou? Porque já lhe teriam de pagar a peça de qualquer modo?

E como se explica a impressão de apenas 500 exemplares do catálogo da exposição? E como se explica que não esteja um único disponível para consulta, não existindo outro modo de o visitante conhecer os artistas em presença? Tem de comprar o catálogo? Estarão à espera de 500 visitantes? Perdão! 500 não! 140 catálogos são para os artistas (2 a cada), pelo que só 360 felizardos (com possibilidade de dar os 25,00 € que ele custa) conhecerão o percurso dos autores dos trabalhos expostos - partindo do princípio que a organização não oferece nem mais um exemplar a ninguém! Assumo que sou elitista, mas não exageremos!

E quem era aquele pintor cujo nome aparecia junto de um tríptico mas não encontrava correspondência, nem no folheto com os artistas seleccionados, nem no catálogo?

Claro que nem só de aspectos negativos viveu esta inauguração do prémio Amadeo - esteve bem concorrida, Júlio Pomar foi um digno consagrado e a exposição de Amadeos é um gosto de se ver (principalmente os desenhos!) - mas se criticar apenas positivamente ainda acusam A Sombra de querer fazer sombra à memória do Acontece. Além do mais, um Prémio destes merecia melhor tratamento organizativo.

Postas as dúvidas, fica a sugestão:
A visita ao MMASC vale a pena. E um jantar na rua do Covelo, numa das varandas sobre o rio, também.

nota:
O tríptico que menciono acima é do meu amigo que foi seleccionado, e a organização insiste em chamar-lhe "A.R.S." (mesmo, como se fosse uma sigla daquelas usadas em Bruxelas).
Será que a palavra "Ars" não lhes diz nada?

Olha...


E eu a pensar que o Fabien não tinha ido de férias para as Bermudas...
A julgar pela rentrée, se calhar foi a imprensa que se enganou no nome e trocou o "e" pelo "a".

Bienvenu, Fab.