quarta-feira, julho 09, 2003

Linces


(*) Entrada actualizada com texto referente a Lince II (no final)


Lince I - Do Lince Ibérico

Regista-se com agrado a anunciada tentativa de reprodução em cativeiro do lince ibérico. De acordo com o Público ("Espanha vai tentar reprodução do lince-ibérico em cativeiro", p30, 09Jul2003), o Parque Natural de Doñana contratou um biólogo especialista neste campo, o da reprodução de espécies ameaçadas em cativeiro, e espera conseguir o prodígio com três fêmeas e três machos do simpático e raro felino. Que esta iniciativa resulte e sirva de exemplo a Portugal; não aos seus biólogos, que muito fazem em condições inacreditáveis, mas aos seus governantes, que nos têm brindado com mimos de consciência ecológica e ambiental, como sucedeu no Alqueva há bem pouco tempo, zona que, aliás, se inclui no habitat do lince ibérico no nosso País. Espero que nenhum desses pobres animais tenha perecido na catástrofe, como sucedeu com inúmeros outros de outras espécies, aprisionados em ilhotas provocadas pelo enchimento da albufeira, condenadas a imergir... Apesar de não ser adepto da pena de morte, não encontro outra punição adequada para os imbecis responsáveis por este crime do que o seu abandono numa dessas ilhotas, amarrados de pés e mãos.

Lince II - Do Lynce

A lei de Autonomia Universitária sempre foi uma lei de "borracha", existindo para permitir às Faculdades atirar as responsabilidades para as Reitorias e estas para o Ministério e este para as Faculdades e... A propósito das alterações a esta lei, propostas pelo Governo, dois pontos de vista surgem no Público de hoje ("Reitor do Porto diz que lei da autonomia é 'uma manta de retalhos"', p30, 09Jul2003):
O primeiro vem desse mentiroso que dá pelo nome de José Novais Barbosa, reitor da UP, que afirma que a proposta foi "pescar" ideias ao CRUP (Conselho de Reitores das Universidades Portuguesas), como se tal coisa fosse um crime, mas omite que alterações fulcrais foram inspiradas em ideias defendidas pelos estudantes, como a avaliação pedagógica dos docentes TAMBÉM pelos alunos (o "também" em destaque é para os mais distraídos e para os idiotas), realizada no quadro das competências dos Conselhos Pedagógicos (Jornal de Notícias, "O ensino em tribunal", por J. M. Paquete de Oliveira, 16Jun2001). Que um Reitor assuma o corporativismo docente, passaporte para mais um mandato (que saudades de Alberto Amaral!), não espanta.
O que nos leva ao segundo testemunho, o de Nuno Mendes, presidente da FAP (Federação Académica do Porto), que tem esta afirmação, ela sim, espantosa: "Isso (a avaliação pedagógica dos docentes TAMBÉM pelos alunos - este "também" é para ti, ó Nuno) só pode ser uma brincadeira de mau gosto. Os estudantes nunca pediram para avaliar os professores; o que sempre reivindicaram foi que (os professores) fossem formados pedagogicamente."
Que grande dirigente estudantil! Mais um que pensa que a Universidade apareceu quando ele lá entrou. Uma das principais questões que moveu a luta que travamos, no tempo em que eu era presidente da Associação de Estudantes da FBAUP (Belas Artes do Porto), foi a capacidade de avaliação pedagógica dos docentes pelos alunos, o que levou a processos contra alguns de nós em tribunais; processos que ganhamos, para espanto e terror dos defensores da mediocridade na docência, não só na FBAUP como em todas as Universidades de Portugal (Diário de Notícias, "Estudantes já podem julgar professores", 12Jun2001).
Mas isso era no tempo em que os dirigentes associativos estudantis ocupavam as escolas e tinham um judite em cada telemóvel e eram atirados para os tribunais, como arguidos em processos crime intimidatórios, pelos professores que eram obrigados a escolher e que os queimavam nas fogueiras dos exames, quanto mais não fosse por terem perdido os julgamentos.
Olha, Nuno, dedica-te mas é à Queima, que, isso sim, é que vale a pena. Pode ser que te venham a convidar para dirigente de um clube de futebol, às custas disso. Agora de política educativa, faz um favor aos estudantes da tua Academia: está mas é caladinho, que assim não envergonhas ninguém e, para mais, fazes um favor ao teu pai, coitado.

(*) actualização

Carta enviada ao jornal Público, por altura da decisão dos tribunais acima referida, que dava razão aos alunos no processo de difamação que lhes foi movido por alguns docentes da FBAUP:

Porto, 12 de Junho de 2001

A força da razão

Não acontece muitas vezes, neste País, mas desta vez aconteceu. Quatro anos depois, os Tribunais de Instrução Criminal e da Relação do Porto absolveram os estudantes das Belas Artes dessa cidade que três dos seus docentes haviam processado por difamação. O processo foi instaurado por se terem esses estudantes insurgido contra a fraca qualidade pedagógica desses professores, o que, como ficou demonstrado em ambas as instâncias, provaram cabalmente, não com meras afirmações suas, mas, pasme-se, graças a elementos factuais das cadeiras desses docentes fornecidos pela própria Faculdade de Belas Artes do Porto.
Ao Tribunal causou estranheza o facto de alunos se exporem daquela forma, denunciando docentes de que dependiam para concluir as suas licenciaturas... É de admirar, de facto, que neste País ainda exista alguma coragem e vontade de lutar, tão acostumado está ao "laissez faire". Como presidente da Associação de Estudantes das Belas Artes do Porto na altura em que este processo se iniciou, e por ter sofrido pessoalmente as consequências da exposição a que me submeti de vontade própria, não só no caso da avaliação pedagógica dos docentes como na de toda a FBAUP, no processo da Sindicância que o senhor Reitor da UP, Novais Barbosa, boicotou, regozijo-me com esta decisão dos tribunais e com as possibilidades que este precedente vem trazer à vida Académica e Social.
Saibam os actuais dirigentes estudantis aproveitar esta oportunidade única para melhorar o Ensino Universitário e saiba o Estado corresponder às exigências de quem, arriscando o seu futuro, clama por justiça.
Um Estado de Direito não pode fechar os olhos a esta situação, que é a de ter centenas de docentes sem qualidade a formar futuros licenciados. É a penhora do nosso futuro sem hipótese de resgate.
Uma jornalista, na FBAUP, perguntava, ingénua, se tinhamos conhecimento de casos de incapacidade pedagógica em outras faculdades... É caso para perguntar a essa senhora se ela frequentou o Ensino Superior neste País.
Da qualidade da docência na FBAUP, para finalizar, basta lembrar a afirmação generalizada dos professores dessa Escola relativamente a este processo:
"Os alunos não têm capacidade científica para avaliar da qualidade pedagógica dos docentes!" Lapidar!

Rui Semblano
ex-presidente da AEFBAUP
e do Grupo Autónomo de Trabalhadores-Estudantes da AEFBAUP
ex-membro discente dos Conselhos Directivo e Pedagógico da FBAUP
e da Assembleia de Representantes da FBAUP

Sem comentários:

Enviar um comentário