(*) actualização no final da entrada
As rondas pela blogosfera têm destas coisas.
Ainda a limpar as lágrimas e com o estômago à beira de um ataque de cãibras, após uma visita ao Valete Fratres!, fui espreitar duas entradas de outros blogs aí propostas e perdi a vontade de rir. Ao ler esses blogs, deparei com algumas considerações espantosas a propósito dos incêndios florestais em Portugal.
Para não ser acusado de descontextualizar, sugiro a leitura integral das entradas que vou mencionar, através dos links existentes abaixo.
Lido em O Comprometido Espectador:
--- quote ---
Não quero parecer insensível. E muito menos desrespeitar a memória das onze pessoas que já morreram nesta vaga de incêndios. Mas parte da floresta portuguesa que está a arder está a arder muito bem. (...)
--- end quote ---
Este "espectador" (as aspas acompanham a ironia do autor do blog, já que nenhum "espectador", principalmente um "comprometido", escreveria um blog) menciona a origem artificial da maior parte da floresta de pinho portuguesa (não menciona o eucalipto, aparentemente ignífugo) herdada do salazarismo. Aponta, ainda, para a impossibilidade de manter estes "horrores", que são as florestas do interior, pela falta de gente que os mantenha, que assegure a sua manutenção, por contraste com as "maravilhas" que não carecem desse serviço para se manterem, como as searas e os montados alentejanos. Portanto, segundo ele, é deixar arder a parte que arde, não quantificando a mesma.
Quando se escrevem certas barbaridades, como "parte da floresta portuguesa que está a arder está a arder muito bem", não há nada que as desculpe, principalmente protestos de sensibilidade à laia de prefácio.
Não se querer parecer insensível é, apenas, um voto de quem não tem sensibilidade.
A sensibilidade não é um objectivo a atingir por etapas.
É algo que se tem. Ou não.
Lido em Liberdade de Expressão:
--- quote ---
(...) A floresta portuguesa é uma plantação artificial e insustentável. Existem incentivos para a renovar após cada incêndio, mas não existem condições para que ela se mantenha com as dimensões actuais porque não existem pessoas interessadas em conservá-la. E por isso, a floresta é vulnerável a incêndios e representa um perigo para a saúde e para a vida das populações.
--- end quote ---
Ao contrário de alguns "comprometidos", o Liberdade de Expressão acertou na mouche ao baptizar o seu blog. Em democracia, nada a dizer. Cada um diz (e escreve) o que lhe apetece. Mais um adepto do abate da área florestal existente para dimensões proporcionais à população rural - não li neste blog o elogio do belo macquis mediterrânico, uma paisagem tipicamente transmontana, como todos sabemos - com o acréscimo de fazer depender a existência de florestas de interesses económicos.
A confirmá-lo, esta enormidade: "As actividades florestais devem ser economicamente sustentáveis. Não basta que sejam ideológica ou sentimentalmente sustentáveis".
Pronto. Está justificada a destruição da Amazónia. Entre o lucro de ter aquela madeira toda ali parada a apodrecer à chuva e ao sol ou cortá-la toda às tábuas, a escolha, para este senhor, é óbvia. Salva-se, no Liberdade de Expressão, o não existirem lágrimas de crocodilo. Sensibilidade não é um factor. Já o lucro, perdão, o economicamente sustentável...
nota:
Congratulo-me por viver num país onde os que assim escrevem e pensam o fazem invocando um direito que lhes é inteiramente extrínseco.
Plaudite, cives!
(*) actualização (10Ago2003, 02:50)
To set the record straight:
De facto, apenas a entrada d'O Comprometido Espectador estava referida no Valete Fratres!, mas foi através dela que cheguei ao Liberdade de Expressão.
Fica o registo.
March 22. Portugal.
Há 12 anos
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