sexta-feira, julho 25, 2003

Erik

(não é uma entrada sobre Vikings)

Com prazer, constatei n'A Pedra e a Espada e no Abrupto algumas notas sobre Erik Satie, nomeadamente sobre uma peça para piano de 24 horas de duração, a que JPP chama Vexations, e bem.

Erik Satie é o meu compositor fetiche. Memória de uma infância nostálgica, passada entre livros de Cavalaria, contos de fadas e imagens em tons de pastel... As suas Gymnopédies acompanham-me desde criança, ainda hoje me comovendo por um motivo que nada tem a ver com a beleza do tríptico, mas com algo que está enterrado no meu subconsciente e que não sei identificar. Mas que permanece. Imutável e sereno, como as crianças que dançam em Esparta, ainda, diz a lenda...

Sobre os intérpretes, inúmeros, destaco os meus favoritos, primeiro o incontornável Pascal Rogé, de que guardo a melhor (para mim) interpretação das Gymnopédies, seguido de Andrea Tedesco, mais fresco, mas não tão doce como Rogé. Por último, o incrível Anders Miolin, que tem interpretações de Satie em Guitarra Alto, uma guitarra clássica de onze cordas, instrumento raro e de difícil execução, incluindo uma versão das Gymnopédies absolutamente surpreendente.

Este último registo, da Bis, em CD (BIS-CD-586 DDD), datado de 1993, encontra-se totalmente esgotado, pelo que me disponho a arranjar uma cópia aos amantes de Satie que me contactarem para o efeito, apenas pelo prazer que me dá partilhar boa música. O meu e-mail encontra-se à direita, sob Faça Sombra, em à sombra do Semblano, naturalmente.

Quanto à peça que PJF e JPP abordaram, alguns esclarecimentos.
Trata-se de Vexations, como diz José Pacheco Pereira, mas esta pode não ser, no entanto, uma peça de 24 horas de duração, como diz PJF. No entanto, está perto da verdade.

Vexation é um trecho com um tema e duas variações de 1 a 2 minutos de duração, com uma particularidade interessante. Erik Satie compôs este motivo para ser tocado 840 vezes, consecutivamente, o que resulta, segundo a tradução do intérprete, num tempo de execução entre as 18 e 28 horas.
O próprio Satie escreveu na partitura de Vexation:
"Pour se jouer 840 fois de suite ce motif, il sera bon de se préparer au préalable, et dans le plus grand silence, par des immobilités sérieuses."
Esclarecedor.
Ao conjunto da repetição deste motivo é dado o nome Vexations, plural, identificando a totalidade da peça, ao passo que Vexation, singular, é o trecho, lui même.
Pessoalmente, acho o motivo insípido e a peça, na sua totalidade, um aborrecimento. Daí o fascínio de John Cage por ela (tocou-a em 1965, tinha eu 2 anos, felizmente!).
É uma peça mínimal do período Rosicruciano de Satie, o que mais me fascina, esteticamente, e aquele que menos me agrada, melodiosamente, com algumas excepções, como as composições para a peça Le fils des étoiles, de Sâr Peladan, belíssimas.

Fica a achega e a satisfação de ver como, por mais vezes que possa parecer, aristocracia e burguesia têm pontos comuns de interesse. E um bom gosto (in)comum.

nota:
Aos que seguiram o Link d'A Pedra e a Espada para a amostra de uma composição de Satie, fica a sua identificação: trata-se de Verset laïque et somptueux, de 1900. Boa escolha.

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