sábado, setembro 27, 2003

A brisa do Tejo...


Já por diversas vezes participamos em trocas de ideias motivadas por sugestão do Nuno P., da Janela para o rio. Até agora, porém, excepto direccionamentos nas entradas que lhe dizem respeito, ainda não existia uma ligação para o seu blog, nem nos Links Gerais d'A Sombra - o que foi um lapso.

Pois bem.
Não só entra na lista geral, como passa a constar em permanência da nossa lista de Blog Links, nesta página. Já não era sem tempo.
Em jeito de desculpa, e com uma ironia que sei irá compreender, aqui fica um poema dedicado à Janela para o rio.


O Tejo é mais belo que o rio que corre pela minha aldeia,
Mas o Tejo não é mais belo que o rio que corre pela minha aldeia
Porque o Tejo não é o rio que corre pela minha aldeia.

O Tejo tem grandes navios
E navega nele ainda,
Para aqueles que vêem em tudo o que lá não está,
A memória das naus.

O Tejo desce de Espanha
E o Tejo entra no mar em Portugal.
Toda a gente sabe isso.
Mas poucos sabem qual é o rio da minha aldeia
E para onde ele vai
E donde ele vem.
E por isso, porque pertence a menos gente,
É mais livre e maior o rio da minha aldeia.

Pelo Tejo vai-se para o mundo.
Para além do Tejo há a América
E a fortuna daqueles que a encontram.
Ninguém nunca pensou no que há para além
Do rio da minha aldeia.

O rio da minha aldeia não faz pensar em nada.
Quem está ao pé dele está só ao pé dele.


(Alberto Caeiro in Athena, n.4, 1925)

Um abraço ao Nuno P.

Pel'A Sombra,
RS

Quais propinas, qual quê!


Traduzido de e-mail enviado por Spencer Cruz
(yrhkrd92qm@friendlysams.net)

--- quote ---

Graus académicos disponíveis em
pretigiadas universidades não reconhecidas.


Tem o conhecimento e a experiência, mas faltam-lhe as qualificações?
Tem sido recusado uma e outra vez ao concorrer ao emprego dos seus sonhos por não ter a sigla certa junto ao seu nome?

Obtenha hoje mesmo o prestígio que merece!
Promova a sua carreira desde já!
Bacharel, Master e PhD disponíveis para a sua área!
Sem exames! Sem aulas! Sem livros!
Telefone para se registar e receba o seu grau académico dentro de dias!
24 horas por dia, 7 dias por semana!
Confidencialidade assegurada!

203-286-2187 - USA
44-207-681-2635 - INTERNATIONAL

--- end quote ---


Pronto.
Agora sim, o PhD ao alcance de todos.
Power to the people...

Princess of Darkness


Só visto.
A Pedra e a Espada e PJF continuam a surpreender.

Blogosphaera magnificat.


nota:
Por sugestão do autor, foi alterado o género do substantivo masculino do anterior título, passando a ler-se "Princess" onde se lia "Prince".
E, realmente...

Years...


Um lapso de escrita, fruto do ano corrente, adulterou este texto. Já está corrigido, embora me pareça que devem os leitores ter dado pela gralha.
De facto, era de 2001 que falava, não deste ano de 2003.

:)

(referente à entrada "Amostra")

Tintin por Tintin


A semana passada, junto com o Público, recebi o álbum "Rumo à Lua", de Tintin. A qualidade de impressão era muito má, faltavam cores, o papel era péssimo, quase transparente, mas volumoso, quase não cabendo na capa, deformando a lombada.
Ontem, decidi ver se a minha desconfiança estava certa. E estava.
O papel era bem melhor, e a qualidade de impressão também. Só que ontem não me ofereceram o álbum "Explorando a lua". Custava 4 euros.

Como amante de BD, cheguei a pensar em fazer todo o Tintin com o Público, mas a má qualidade geral desta edição, principalmente a tradução e colocação de legendas (péssima) levam-me a permanecer fiel à versão original em língua francesa. Escolhas.

O que lamento não é isso, mas o facto a que me referi no início. Fazer uma colecção em que o primeiro número, por ser gratuito, vem impresso em papel higiénico não parece ser uma boa forma de cativar leitores.
Ao menos, para os que a vão fazer, que reeditem "Rumo à lua" nas mesmas condições dos álbuns seguintes.

Às vezes, esqueço que o Público é português...
Mas o Público parece não se esquecer.


Rui Semblano
Vila Nova de Gaia

(carta enviada ao jornal Público a 27-09-2003)

In the words of the virgin Mary: Come again?

(*)

Lido em O Comprometido Espectador:

--- quote ---

(...) Noutros blogs também apareço em geral classificado ou na “santa aliança”, ou no “lado direito” ou noutros sítios igualmente recomendáveis.
Eu juro que nunca me classifiquei a mim mesmo dessa forma. E se alguma vez o fiz foi só para chatear. Sem querer intrometer-me demasiado nos vossos princípios editoriais, bem gostava de perguntar: afinal que critérios presidiram à vossa classificação? Obrigados.

--- end quote ---


Espero que não seja uma pergunta de retórica...
Espectemos.


(*) in Snatch (claro!)

Flying Snow...


Maggie Cheung Man Yuk

E, sim, o Cinema para Indígenas tem uma nova entrada.
Lose the popcorns this time. :)

sexta-feira, setembro 26, 2003

Public Enemy


F-A-B-U-L-O-S-O!

Todas as sextas, a partir de hoje,
"rumo ao orgasmo vertical".

'Bora lá!

Jornalismo e preconceito


A propósito de uma entrada de Pedro Mexia, no Dicionário do Diabo, em que se fala do preconceito inerente ao jornalista e de como ninguém é isento.

Por isso me mato a rir com o Valete Fratres! e o seu trabalho hercúleo ao recolher a informação que mais lhe convém como mais lhe convém, acrescida, ocasionalmente, de alguns enfáticos comentários. Mas continuo a ler o Valete. Sempre que posso. É importante.

É claro que sim, Pedro, jornalismo e preconceito andaram sempre de mãos dadas, mesmo se apenas, e claro que todos devíamos ter disso consciência. Carlos Fino não é isento; José Manuel Fernandes não é isento; Fátima Campos Ferreira não é isenta (bom... antes ela que o "presunto com olhos - essa não é isenta; é Alberta, mesmo!)... Nenhum jornalista o pode ser. Nós não o podemos ser. Ninguém o é.

Por isso é tão importante cruzar informação extraída de diversas fontes de carácter oposto. Porque a informação é dada de bandeja, mas o conhecimento procura-se. E por isso é tão importante saber ler nas entrelinhas como nas linhas. Por isso é importante saber ver as imagens para além do comentário que as acompanha. Por isso são importantes os espaços de pura observação, como o "No comments" da Euronews, que todos podemos recriar em qualquer canal com um toque no telecomando ou um girar do volume de som. E sim, até as imagens sem comentário não são isentas.

Isenta deverá ser a nossa análise da informação, mas nunca o será, na verdade; pois os nossos olhos vêem e lêem sempre o que aprenderam a ver e ler. Por isso é importante entender, que toda a procura do conhecimento é aprender.

Mais um Graal para buscar... Entre tantos.

Truth as an Art form


We must never forget that art
is not a form of propaganda;
it's a form of truth.


John Fitzgerald Kennedy
Amherst college, 26 de Outubro, 1963

Hard on


Em uma troca de e-mails com múltiplos intervenientes, a propósito da chamada de atenção de um blogger, também via correio electrónico, para algo que não nos mereceu cuidado, a Rata Maluka considerou a resposta que enviei a esse blogger "um pouco dura".
Aqui reproduzo o que escrevi à "Rata" (salvo seja!), para benefício dos que seguiram o "caso" por e-mail; porque lhe achei graça, à "maluca da rata", e porque o humor nunca se deve afastar muito da blogosfera.

----- Message -----

From: Semblano, Rui (gsm)
To: Rata Maluka
Sent: Thursday, September 25, 2003 3:04 PM
Subject: Hard on


Cara Rata Maluka,

Apelando ao seu sentido de humor, não é meu costume ser "um pouco duro", mas "muito duro" (desculpe, o seu nick é irresistível) - mas o reparo ao [blogger em questão] era um misto de humor e liminar recusa de fazer propaganda a um blog que não a merece. Nothing more.

Um grande abraço,
RS

----- End of message -----


Agora; não sei como, este e-mail foi parar ao Pipi...
Resultou daí que tenho a honra de ter recebido um valente e-mail do dito, com um teor que me coíbo de transcrever aqui e a que respondi, assim o recebi. (Xiii...)

Se vos surgirem, portanto, palavras "menos recomendáveis" a vogar pela blogosfera, por mim assinadas, não se admirem. Como poderia ter respondido de outro modo? Em Roma como os romanos. No Pipi dele como no nosso. :)

O homem da motorizada está vivo


Durante uma "reunião secreta" no Sul do Afeganistão, o mullah Omar apelou à Jihad contra os norte-americanos e os afegãos que com eles colaboram.
Rumores de fontes credíveis levam a crer que, após ter proferido a sentença, Omar montou na sua motorizada e desapareceu... Outra vez.

Rats...

Amostra

As sondagens valem o que valem (vejam a amostra). *

Wesley Clark.
O tempo dirá se estou certo, ao pensar estar encontrado o próximo presidente dos EUA. O "actual" está condenado há muito. O 11 de Setembro de 2001, mesmo nas mais mirabolantes teorias da conspiração, nunca foi desenhado para o preservar, mas sim para o fazer "colaborar" ("play ball" - como lhe chamam). Se interesses havia a preservar, eram os que ele tão mal defendera até essa data.
"Dubya" cairá. Mas não sem que os que o animam tentem evitar a sua queda.

Resta saber até que ponto Wesley Clark será reformador; até que ponto será "democrata", não apenas de partido, mas de facto, pondo um fim à perfídia do USA/PATRIOT Act, entre outras coisas, como Guantanamo. Veremos se estará à altura do que lhe é exigido ou se será, apenas, um Bill Clinton mais.

Se, de facto, pretender ir até ao fim, espero que a sua segurança seja melhor do que a de Jack Kennedy. Vai precisar dela.

(também no Público, 25Set2003, p.16,
"Americanos preferem Wesley Clark ao actual presidente")

* sim, é um trocadilho.


nota:
JFK não é um modelo de virtudes, pessoais ou políticas. A sua obsessão com os "comunistas", na tradição de Truman, e os seus vícios privados, não permitem que se diga: aí está um paradigma da humanidade.
Era, simplesmente, um homem, não um super-homem.
As suas atitudes políticas devem ser analisadas à luz do que era o mundo de então. Para mim, com todos os seus defeitos, era um modelo de humanidade. Todos somos humanos. Ele não foi excepção.

Faço eco das palavras que ficaram gravadas a fogo no meu cérebro, desde a primeira vez que as ouvi deste modo, ditas por Jack Kennedy, abatido por cobardes seis dias antes do meu nascimento:

"What kind of peace do I mean? What kind of peace do we seek? Not a Pax Americana enforced on the world by American weapons of war. (...) For, in the final analysis, our most basic common link is that we all inhabit this small planet. We all breathe the same air. We all cherish our children's future. And we are all mortal."

"De que tipo de paz falo? Que tipo de paz procuramos? Não uma Pax Americana, imposta ao mundo por armas de guerra americanas. (...) Em conclusão, o nosso elo comum mais elementar é todos habitarmos este pequeno planeta. Todos respirarmos o mesmo ar. Todos prezarmos o futuro dos nossos filhos. E todos sermos mortais."

American University
Presidente John F. Kennedy
Washington, D.C.
10 de Junho, 1963

Terror & AIDS


José Pacheco Pereira não considera o terrorismo comparável à SIDA.
(Público, 25Set2003, p.8, "Terrorismo e sida não são comparáveis")

Presumo que ainda não se encontrou frente à agulha de uma seringa empunhada por um infeliz seropositivo que nem sonha quem ele é...

quinta-feira, setembro 25, 2003

[a]Creditar


Recebemos 22 e-mails do Descrédito.
Em todos eles, porém, o mesmo texto.

--- quote ---

Para os que ainda não conhecem, apresentamo-vos o blog DESCRÉDITO !

O blog onde, entre outros, Pedro Sá e Mário Garcia comentam a actualidade
política nacional e internacional, numa perspectiva de esquerda moderna para o século XXI, não virando costas à polémica se for caso disso !

--- end quote ---


... Vezes 22. We ARE impressed. Chama-se a isto acreditar no seu valor.
Já antes tinhamos reparado no Descrédito. Continuaremos a acompanhar, sempre que possível, o seu estado.
Entretanto, lançamos os seus e-mails a... creditar.

Um abraço para Pedro Sá e Mário Garcia.

Picket fences


Lido em publico.pt:

--- quote ---

Grupo de Observação do Iraque
Iraque: primeiro relatório sobre armas de destruição maciça
revela-se inconclusivo

Um primeiro relatório elaborado pelo norte-americano David Kay, chefe do grupo de peritos que investigam a existência de armas de destruição maciça no Iraque, "não chegou a conclusões definitivas", revelou hoje um porta-voz da CIA.
"O doutor Kay continua a receber informações do terreno. Este será apenas o primeiro relatório provisório e por isso não terá conclusões definitivas, nem irá excluir quaisquer hipóteses", afirmou Bill Harlow.

--- end quote ---


(notícia completa aqui)


"(...) Este será apenas o primeiro relatório provisório
e por isso não terá conclusões definitivas (...)" ?????

Com este já não se metem.
(vá saber-se porquê...)


nota:
Imaginem que numa emissão antiga do Forum da TSF o tema era "Quem deve dirigir a reconstrução e democratização do Iraque?" e que, continuemos a imaginar, 1.689 ouvintes ligavam a apontar a ONU ou os iraquianos e apenas 189 apontando os EUA, restando 366 que entendiam que os EUA devem assegurar a presença militar enquanto que a ONU a transição para um governo iraquiano e outros aspectos civis.
Que rádio mais facciosa que era a TSF...

Pois era. E estes resultados não são imaginados; são os da última sondagem publico.pt, à hora de publicação desta entrada.
Um jornal tendencioso, este Público.
Só aceita os votos dos que lhe interessam.
Bolcheviques...

O moço da jorna


Hoje encontrei o Barman. Não um, mas o.
Curiosamente, por este ter mencionado a publicação da Pedra Filosofal (pelo Fabien) n'A Sombra. Uma referência à música de Manuel Freire a propósito de uma polémica em torno da sua eleição para a direcção da SPA e de... João Hugo Faria (JHF).

Para o Barman, tudo indica (o que verifiquei) que o moço da jorna está para JHF como Herman José para o infeliz deficiente mental que enxovalhou um dia. Não gosto de enxovalhos.

Nunca tinha visitado o blog de JHF.
Ao ir até lá, encontrei isto:

--- quote ---

teste
Wednesday, September 24, 2003

este blog foi cancelado
- posted by joao @ 6:54 AM

--- end quote ---


Não sei se tal facto se fica a dever ao mísero trato que lhe foi dado por vários blogs de que o moço da jorna fez eco e entre os quais se inclui. Sei que não me agradou o tom com que JHF foi tratado. Não conhecendo o João Hugo Faria, nem o conteúdo prévio do seu blog, não sei ajuizar do valor de ambos, mas graças ao Barman, pude ver aqui (nos comentários) algo da sua natureza, como este lhe chamou (e bem).

A julgar por extractos descontextualizados (é um neologismo...) de escritos de JHF no blog do moço da jorna e em outros por ele citados, tratou-se de uma embirração gratuita, desprovida de outro sentido que o de enxovalhar. Porque não se trata de discordar de algo que foi escrito, mas de gozar com o que foi escrito e como o foi.

Não imagino porque tomaram JHF de ponta.
Existem muitos, mas mesmo muitos blogs com problemas de semântica e/ou de expressão, para não falar de estilo. O moço da jorna não é um deles e este, por exemplo, também não. Por isso é impossível atribuir a uma dessas lacunas o modo infâme como trataram João Hugo Faria.

Não adianta, portanto, o verniz da semântica e do estilo com que o fizeram.
A expressão do ordinário, do vulgacho que escondia, torna-se visível quando e onde menos se esperaria. Assim; numa palavra solta; num dito distraído.
Numa cobardia.

Esta minha entrada tem um nome preciso; chama-se desprezo.
Não a considerem uma picardia.

quarta-feira, setembro 24, 2003

Reminiscência

Lido em Miniscente:

--- quote ---

"Mas não me venham agora com essa fantasia absurda de que a nossa comunicação social é dominada pela direita. Para além disso, eu não sou de direita."

--- end quote ---


O Abrupto citado pelo Luís Carmelo citado pel'A Sombra.
Porque esta frase vai valer muito e nós adoramos antropologia.

Ooops...


Reunidos os amigos para o que seria um reencontro poético, partimos rumo aos "maus hábitos" de outrora. Lá chegados, para nossa surpresa, demos com o nariz na porta.
"Fechado?!" - exclamei - "Como, «fechado»!?"
Com infinita paciência, o funcionário de serviço da garagem Passos Manuel, no último piso da qual fica o "Maus Hábitos", explicou que o bar só funciona de Quinta a Domingo. E eu que tinha a certeza... A não ser...

23 de Setembro? E porque não de Outubro? Ou de Dezembro, já agora! Um telefonema confirmou-o. É 23 de Outubro... Daqui a um mês. Possivelmente, certamente, o Joaquim não me enganou. Disse-me a data certa. Eu é que a antecipei, inconscientemente; talvez por ser de um tempo em que a poesia e o jazz e a música portuguesa e muito mais, aconteciam distribuídos por todos os dias da semana, ora aqui ora ali.

Quando o "Realejo" ainda não tinha caído em cima do "Luís Armastrondo"... Quando o MEC ainda não andava a pastilhas e caía no Porto de pára-quedas e me perguntava: Sabes onde é o "Bacalhau"? (Lembras-te? Não; é impossível.) Quando o "Pinguim Café" ainda tinha o Palolo na parede e um livro de visitas onde deixei pedaços da minha alma, escritos com sangue negro... Onde andará esse livro...
Todos esses sítios desapareceram, excepto o Pinguim.
Todos esses sítios deixaram de existir. Principalmente o Pinguim.

Existem outros, claro. Mais? Certamente. E depois?
Agora temos noites de poesia com dois meses de marcação prévia...
Parece que vamos a um concerto dos Stones ou coisa assim...
Extraordinário.

nota estranha (ou talvez não):
Nunca entrei no "Maus Hábitos". Não sendo cliente "habitual", não fazia ideia do seu funcionamento, mas o que faziam mais pessoas à porta, procurando entrar, como nós? Foi coincidência?
Sem pretenciosismos, se porventura alguém foi à procura de poesia nesse local por via das palavras d'A Sombra, na noite de 23 de Setembro, e encontrou o mesmo que eu, as minhas sinceras desculpas.
Mea culpa.

Mas que esta noite não passe sem poesia.

M'en vaig a peu


Devo esquecer o telhado vermelho
e a janela com flores.
A escada escura e a imagem velha
que se escondia num canto,
e a cama de madeira negra e velha
e os teus lençois tão limpos,
e a chegada suave da manhã
que te desperta mais velha.

Mas não quero que os teus olhos chorem:
diz-me adeus.
O caminho é a subir
e eu vou a pé.

Devo dizer adeus à porta que se fecha
e que não quisemos fechar.
Devo encher o peito e cantar uma canção
se o frio de fora me faz tremer.

Devo ignorar este cão que agora ladra
atado a um poste seco,
e esquecer de repente a tua imagem
e este pequeno lugar.

Mas não quero que os teus olhos chorem:
diz-me adeus.
O caminho é a subir
e eu vou a pé.

Devo levar a guitarra às costas
e voltar a fazer o caminho
que uma tarde escura subindo ao cabeço
me trouxe até aqui.
As ondas apagarão as pegadas
que deixo no teu porto.
Vou a pé, o caminho é a subir
e dos lados há flores.


Joan Manuel Serrat - "M'en vaig a peu"
("Vou a pé" - tradução de Manuel de Seabra)
in:
Antologia da Novíssima Poesia Catalã
Editorial Futura, Lisboa, 1974

nota:
Para que não se diga que hoje à noite não houve poesia.
(Paulo, se passares por aqui, sabe que o tenho e que é teu.)

terça-feira, setembro 23, 2003

Um péssimo hábito


Desde 1998 que me afastei da poesia, do que era para mim a poesia, quando as suas palavras me enchiam o cérebro e, fechados os olhos, podia lê-las como se nas páginas de um livro.

Um dia, já sem o Joaquim, virei as costas ao meu antro maldito, a cave do Pinguim Café, e julguei esquecer. A poesia mata. Eu escolhi viver.
Saído da memória, surge agora o Joaquim. Materializou-se. Não o consigo ignorar. Hoje regresso ao que foi um péssimo hábito.

Chamo-me Rui Semblano. Sou amante da poesia. Há quatro anos, oito meses e vinte e dois dias que me mantenho sóbrio. Daqui a pouco vou prová-la, de novo. Só um cheirinho não deve afectar-me...

Não creio que seja um regresso a um péssimo hábito.
Mesmo tratando-se de Joaquim Castro Caldas.
Mesmo num local que tem por nome "Maus Hábitos".

Se sobreviver, contarei como foi.

Votos


Na sequência de mais uma proposta para reflexão vinda da Janela para o rio, aqui ficam algumas considerações sobre o sistema eleitoral e parlamentar em Portugal. Para referência, uma vez que as hipóteses formuladas como base pelo Nuno P. estão no seu blog, recomendamos uma leitura das mesmas, anterior à desta entrada.


Votos:
a democracia como fim


A discussão dos vícios e virtudes dos círculos eleitorais uninominais e nacionais conduz a um beco sem saída, quando adaptados à nossa realidade. Temos demasiados partidos. Um representante escolhido uninominalmente, como sendo a personalidade que melhor representa um determinado conjunto de cidadãos em determinada região, pode não ser o que os mesmos cidadãos preferem para uma representação nacional, por via do partido que representa.

A nível autárquico, onde a personalidade do indivíduo conta mais que a plataforma eleitoral dos partidos e se sobrepõe a ideologias partidárias, não é raro encontrarmos autarcas independentes ou de um partido que, nas legislativas, não encontra a mesma expressão na contagem de votos, nessa zona.

Somos um país pequeno; na área metropolitana de Nova Iorque vive mais gente que em Portugal inteiro. Não existe motivo para criar dois círculos eleitorais justapostos, um uninominal e outro nacional, acrescidos de uma escolha específica de Governo.
Podemos, simplesmente, entrar directos num sistema uninominal exclusivo, pois os representantes assim eleitos têm condições para ser "da Nação" e não apenas da região de onde provêm. A este método deverá, então sim, juntar-se a eleição independente de um Governo.


Em temos concretos,

a)
Isto significa que cada círculo eleitoral escolhe o seu representante individualmente, enquanto cada partido propõe um Governo. O círculo nacional é assim reduzido (ou promovido, dependendo do ponto de vista) à escolha governativa, sendo todos os deputados eleitos uninominalmente.
Não creio que, em Portugal, isto signifique a perda do carácter nacional do parlamento. Somos demasiado pequenos para que tal aconteça. Qualquer deputado do Porto pode inteirar-se de uma situação ocorrida no Algarve e vice-versa.

b)
Resultado das eleições para o parlamento:
Um conjunto de cidadãos escolhidos pelos seus pares, que se distribuirão na Assembleia da República de acordo com a área política em que se inserem.

c)
Responsabilidade directa:
O deputado eleito no meu círculo eleitoral não corresponde às expectativas? Reuno o número de assinaturas (dentro do meu círculo) que será estipulado para esse efeito e o representante em causa é removido de imediato, sem mais, sendo eleito um outro para o seu lugar. Não se encontra nenhum? Paciência. Fica a cadeira vazia. Quem não faz nada para ser representado é porque não o necessita. E, quer na eleição como na eventual reeleição, não são nomeados substitutos. Um deputado falha ou é removido ou fica incapacitado e apenas uma nova eleição pelo seu círculo poderá preencher o lugar deixado vago. Os emigrantes constituem círculos próprios, de acordo com o seu número e distribuição geográfica, estando sujeitos às mesmas regras.

d)
Governo:
O programa de um Governo deverá ser apresentado, assim como a sua constituição, antes das eleições, de forma inequívoca e sem zonas em branco, incluindo possibilidades de coligação com outras forças e o seu significado e impacto no programa governativo.
A votação para o Governo deve ser directa e universal, efectuada em paralelo com a votação para o parlamento. Os candidatos a governantes não poderão, em caso algum, ter assento como deputados pelo período a que concorrem como tal.


Possíveis consequências:
Uma maioria, por exemplo, de deputados independentes no parlamento. Um governo de sinal contrário à maioria parlamentar. Uma grande dificuldade em efectuar "arranjos" entre bancadas parlamentares, dada a dificuldade em saber onde estas acabam ou começam. A alteração da ordem parlamentar como a conhecemos, esbatendo-se a noção de "direita" e de "esquerda", como a de "centro", aliás. Mais pessoas, menos rótulos.

Consequências certas:
Responsabilização directa e com consequências imediatas de cada um dos deputados por si e não dos seus partidos por eles. Fim dos "escudos" partidários". Envolvimento permanente dos cidadãos, através do processo de avaliação contínua dos seus representantes directos. Fim da ascensão política por "elevador" de perfeitos desconhecidos.


É evidente que qualquer alteração deste calibre, que mexa em todos os aspectos dos sistemas eleitoral e parlamentar, dará um trabalho medonho de remodelação, exigindo ainda, uma vez implementado, um tipo de participação política ao cidadão comum a que este não está habituado, sendo bem mais que uma simples ida às urnas de quatro em quatro anos. Mas ninguém disse que a democracia era um sistema fácil.
Quanto ao que existe, embora a base justifique a denominação de "democracia", continuo a considerá-lo uma caricatura, pelo simples facto (entre muitos outros) de um Governo poder rodar 180 graus a sua política e termos de nos resignar a isso.

Democracia significa responsabilidade, antes de tudo, e o nosso sistema tem primado pela desresponsabilidade de tudo e todos. A mal da Nação.

E, neste ponto, passo a palavra.

Como todas as propostas, esta tem os seus pontos fracos, mas considero-a evolutiva, em relação ao sistema existente, apelando a uma participação cívica na vida política muito elevada e cativante. É a minha opinião, nada mais. :)

Rui Semblano
Porto, 23 de Setembro de 2003


nota:
Apenas para chamar a atenção para a importância dos votos em branco em qualquer processo eleitoral. Quando, em determinado círculo, estes excedam um nível preestabelecido, o processo eleitoral deve ser repetido com novos candidatos. Tal, porém, em nada inviabilizaria a entrada em funções do parlamento, no caso dos deputados. No caso dos Governos, uma vez que serão eleitos como um todo, este problema não existe. Sendo a sua eleição inviabilizada por votos brancos, aguardar-se-á, serenamente, por novas alternativas, mantendo-se o anterior em funções de mera gestão, impossibilitado de tomar decisões novas.

Previews


(*) Entrada revista - ver no final.

Para breve, n'A Sombra:

O Futuro Tenso
A análise dos ensaios de José Pacheco Pereira, Gonçalo Ribeiro Telles e Pedro Mexia, publicados na Grande Reportagem 150. Está prometido (e não esquecido) desde a partida do Mestre para férias.

Jornalismo e preconceito
a propósito de "Venham mais cinco (centenas)" - PM

Votos
Considerações sobre o nosso sistema eleitoral e alternativas ao mesmo, conforme a proposta (mais uma) de Nuno P., em mais um dos seus repto-mails enviados para A Sombra.

Isto, entre outras coisas... As usual.

(*)
Todas as entradas aqui anunciadas estão publicadas n'A Sombra, encontrando-se já direccionadas pelos títulos e/ou autores.
(entrada fechada a 20 de Outubro de 2003)

Graça


Registo com agrado que Fabien (FJ) decidiu comentar o Demo.
Não está mal, não está mal... Já tinha passado pelo "Tut", mas como já editara demasiado nesse dia, passou em claro.

Agradeço o e-mail do nosso leitor "blogless", o Paulo, que espero continue a passar nesta Sombra. O repto foi aceite e dispensa mais comentários.

nota:
Excepto este: Anestesiado não estou, mas dado o novo formato do blog de Pedro Mexia, decidi conceder-lhe um "estado de graça". :)
For a little while, anyway.

Reaganite


A long time ago in a galaxy far, far away...

Quase era cometida uma falta grave, n'A Sombra, ao colar Donald ao pai do W. e não ao Ronald... (é o que dá editar entradas de madrugada) Aos que deram de caras com a enormidade fica a sugestão de nova leitura.

By the way:
Ronald, lembram-se dele? O que acabou com a Guerra Fria?
Dizem as más línguas que se preocupava de mais com o Médio Oriente.
Deixou de olhar para os russos um bocadinho e pronto.
Foi no que deu.

Quem paga o quê


Eduardo Prado Coelho (EPC), na esteira de João Lobo Antunes e de Manuel Sobrinho Simões, interroga-se sobre o financiamento do Ensino Superior público. (Público, 22Set2003, p.7, "Quem paga a Universidade?")

Pelo sim, pelo não, as Associações de Estudantes universitários, reunidas no Funchal (1) para mais um ENDA (Encontro Nacional de Dirigentes Associativos), avançam um calendário de contestações à política do Governo para o sector. (Público, 22Set2003, p.19, "Estudantes do Superior fazem greve a 21 de Outubro")

Como escreve EPC, "com pendular regularidade", as associações académicas tentam mobilizar a estudantada para lutar contra as propinas - no caso, já só contra o seu aumento. Ainda fazia sentido falar sobre a sua inexistência, tal como a conhecemos, nos idos de 96 a 98, e já me parecia óbvio que o caminho não passava por um "não" a algo que, aliás, já existia há muito, embora se confundisse com a taxa de inscrição ou matrícula e fosse uma ninharia.
O motivo pelo qual nunca fui contra o pagamento das propinas e sim contra a sua instauração sem assegurar as suas contrapartidas é complexo, mas o que me levou a ser contra o básico "não pagamos!" chega a ser penoso, de tão simples.

Numa altura em que era esse o lema dos estudantes, durante uma Assembleia Geral de Alunos da FBAUP, perante uma Aula Magna a abarrotar de gente, perguntei:
"Quantos aqui presentes pagam as propinas do seu próprio bolso?"
Envoltos num silêncio demolidor, cinco ou seis braços se ergueram, juntando-se ao meu. Como o meu, eram de trabalhadores-estudantes.
Mesmo assim, os meus dignos colegas não perceberam como o ministro, na altura Marçal Grilo, se ria dos seus slogans ridículos (e muito bem!), e marcharam para a 5 de Outubro a gritar que não pagavam, enquanto os seus pais faziam os respectivos pagamentos na Caixa Geral de Depósitos.

Quando vir os progenitores destas meninas e destes meninos a descer à rua e a gritar "basta!" ficarei impressionado. Até lá, será mais do mesmo. Só falta lembrarem-se de assegurar a mobilização geral, através de uma cervejeira que patrocine as "manifs". Era garantia de avenidas cheias!


(1) Já tenho a minha quota de ENDA's, mas... No Funchal? Viva o luxo, sim senhor. Rica vida. Mas talvez seja injusto, da minha parte.
Afinal, que melhor sítio para planear acções contra a política do Governo da República? Há que aproveitar estas sinergias de contestação!

Powell is nothing without control


A missiva do Secretário de Estado norte-americano, Colin Powell, reproduzida no Público de hoje, é tristemente patética.
(Público, 22Set2003, p.12, "O tempo que for preciso")

É, de novo, o "uncle Tom" (1) quem vem à praça pública defender o seu "amo". As suas palavras, porém, que duvido tenha escrito, demonstram bem o desespero em que Washington está prestes a cair - se não caiu já.
Não creio que as tenha escrito ele próprio porque o desconforto corporal evidenciado por Colin Powell ao fazer declarações desta ordem é semelhante ao que demonstrou quando G. W. Bush anunciou ao mundo que seria ele o mensageiro que revelaria na ONU as "provas irrefutáveis" que serviriam para justificar a invasão do Iraque, por ocasião do discurso do Estado da União, em Janeiro deste ano. Esse desconforto foi evidente a 5 de Fevereiro de 2003 (os grandes planos dos papeis que Colin Powell lia ao Conselho de Segurança da ONU foram impiedosos) e tem-se mantido, mesmo agravado, desde então.

Como se explica que um homem como Colin Powell escreva que esteve no Iraque e considera "bom" o plano dos comandantes norte-americanos para contrariar a crescente vaga de ataques às suas forças, quando ao mesmo tempo (no Público, na mesma página, mesmo ao lado!) vemos um "presidente" Bush de chapéu na mão, quase implorando que a comunidade internacional o ajude? (2)

Como se explica que Colin Powell persista no erro crasso que é identificar as forças que atacam os norte-americanos e britânicos como inimigas do "mundo ocidental"?

Como se explica que Colin Powell use a vala comum de Halabja e os seus 5.000 corpos, enterrados em solo kurdo, para demonstrar a justiça da intervenção norte-americana, quando foi um sorridente Donald Rumsfeld que a cavou, ombro a ombro com Saddam Hussein? (3)

E, principalmente, como pode Colin Powell cair na asneira de ir buscar argumentação outrora usada pela administração de John F. Kennedy e pela de Lyndon Johnson para definir o tipo de empenhamento dos EUA no Vietname?

"Por quanto tempo vamos ficar no Iraque? Ficaremos o tempo que for necessário para entregar toda a responsabilidade da governação do Iraque a uma administração democraticamente eleita". (...) "O povo iraquiano (...) deve receber os instrumentos e o apoio para construir uma democracia pacífica e próspera. Não merece menos que isso."
Colin Powell, Setembro 2003
"As pessoas que dizem que devíamos retirar do Vietname estão completamente erradas, porque se retirarmos do Vietname, os comunistas irão controlar o Vietname.(...)"
John F. Kennedy, Setembro, 1963 (4)
"Não queremos um conflito alargado com consequências que ninguém consegue prever. Nem vamos exorbitar o nosso poder. Mas não nos renderemos. E não vamos retirar."
Lyndon B. Johnson, Julho, 1965
"Independentemente de qualquer ideologia nossa, ou de quem quer que seja. Daremos [aos vietnamitas] o direito de escolha. E se fizermos isso, regressaremos a casa amanhã."
Lyndon B. Johnson, Agosto, 1965

Tanta desinformação e propaganda são demasiado para o punho de Colin Powell. E são demasiado para qualquer cidadão minimamente consciente, mesmo que não minimamente informado. Resta saber se, como nos "anos bons" da relação de Washington com Saddam Hussein, os "instrumentos" do "novo arsenal da democracia" serão, também, postos à disposição do Iraque.

Rui Semblano
Porto, 22 de Setembro de 2003



(1) "Uncle Tom's Cabin", or, "Life Among The Lowly"; Harriet Beecher Stowe; Boston: John P. Jewett & Company 1852 (Dados da primeira edição; em Portugal: "A cabana do pai Tomás")

(2) Por via das dúvidas, a Índia, um dos primeiros países a aceder ao pedido de envio de tropas, já não vai mandar ninguém para o Iraque. Dizem os indianos que têm problemas em Caxemira... É que, realmente, isso já eles têm de sobra, em casa, e só "depois da guerra acabar", a 1 de Maio, os EUA já arranjaram mais 165 "problemas".

(3) Enquanto ao serviço da administração Reagan, Donald Rumsfeld era a ligação de Washington com Saddam Hussein. A julgar por registos visuais da época, eram grandes amigos.

(4) O prelúdio da "Teoria do dominó"
"...These people who say that we ought to withdraw from Vietnam are wholly wrong, because if we withdrew from Vietnam, the Communists would control Vietnam. Pretty soon Thailand, Cambodia, Laos, Malaya would go, and all of Southeast Asia would be under the control of the Communists and under the domination of the Chinese..."
(JFK, September 2, 1963)


nota:
Por via das dúvidas, e para evitar "peixeiradas" desnecessárias, convém esclarecer que considero os casos do Vietname e do Iraque diferentes.
Basta saber que o Congresso norte-americano nunca aprovou a guerra dos EUA na Indochina, ao passo que agora votou a intervenção no Golfo favoravelmente.
Além disto, com a excepção de que se trata de uma intervenção militar norte-americana, interferindo na política interna de um país soberano, que não atacou os EUA, situado a milhares de quilómetros da América do Norte e com o objectivo primeiro de a defender e a todo o "mundo ocidental", não existe semelhança nenhuma entre Bagdad e Hanói.

nota2:
Fontes JFK e LBJ:
WGBH Educational Foundation - Vietnam: A television history.

segunda-feira, setembro 22, 2003

Au revoir, Marie


Longe da vista, mas nunca longe do coração dos portugueses.
Não te esqueceremos.

A mentira


José Pacheco Pereira, no primeiro dia como comentador político da SIC, escolheu falar de uma "grande mentira", que "não se pode evitar".
O Abrupto foi, também, o campeão da propaganda gratuíta à tal "grande mentira" na blogosfera lusa e da divulgação do notório blog que a espalha. E a primeira coisa que faz, ao chegar aos estúdios da SIC, é levar a nova aos que não lêem blogs.
Há coisas que me transcendem...

... Mas que não me espantam.
Para os mais distraídos, a minha entrada "Blind Justice" foi direitinha para a estreia de José Pacheco Pereira na SIC.

Descer à arena


O editorial da última Le Nouvel Observateur (18-24Set2003, p.21) faz eco das palavras de Zeev Sternhell no Haaretz, em artigo intitulado "Israël: Descendons dans l'arène!". Trata-se de um apelo à mobilização da sociedade civil israelita para combater a política de Ariel Sharon.
"É chegada a hora de nos juntarmos no coração de Telavive, como após o assassínio de Itzhak Rabin."
Zeev Sterhell é professor de ciências políticas na Universidade Hebraica de Jerusalém. É judeu. O seu apelo dirige-se, em especial, a forças políticas como o Meretz (trabalhista) ou o Shinoui (laico); aos que se deixaram "adormecer" pelo embalo do partido do poder ou que encolheram os ombros e decidiram olhar para o lado. Mas estarão mesmo "a dormir" e "indiferentes"?

A democracia israelita, já o afirmei aqui, é uma piada de mau gosto. Só assim se compreende que o seu parlamento, o Knesset, considere a hipótese de aprovar leis segregacionistas - considere, sequer, quanto mais votar! - que reflectem o nojo ariano da miscigenação com os judeus, traduzido agora para o nojo sionista da miscigenação com palestinianos. Só assim se compreende que o tema que hoje empolga os media israelitas seja a expulsão ou eliminação de um governante estrangeiro escolhido pelo seu povo.

"Não morrer de amores" por Yasser Arafat será pouco para exprimir o que sinto em relação ao leader palestiniano. Digamos que o seu passado, as suas ligações ao terror de hoje, a sua espinha inexistente, o seu oportunismo e a sua ganância, são motivos mais do que suficientes para o colocar no meu "panteão dos repugnantes". Considero um insulto à humanidade que semelhante réptil tenha recebido um dia o Nobel da paz.
Mas é ele a escolha do seu povo.
Tal como Berlusconi é a escolha dos italianos.
E Ariel Sharon a dos israelitas.

Ariel Sharon é outro exemplo flagrante de como pode ser miserável a democracia, mas insurgir-me-ia de igual modo contra qualquer tentativa de o remover ou exilar por meios violentos, principalmente contra uma exterior à sociedade israelita. Quando me refiro à democracia israelita como uma piada, poderia dizer o mesmo da palestiniana, por motivos diversos, sendo a autocracia assumida o mais evidente, mas não chego ao ponto de as desacreditar na totalidade; isto é, ainda é o povo que escolhe os seus representantes, requisito mínimo para que qualquer sistema, por muito caricatural que seja, se possa chamar de democracia. Se é Arafat que o povo escolheu, também Sharon foi escolhido por Israel.

Quem sabe o que pretende Ariel Sharon ao permitir que se torne público que considera as hipóteses de emparedar, expulsar ou eliminar Yasser Arafat? De todas as conjecturas feitas, a que mais acertada me parece é a que aponta o facto como a "provocação perfeita", no sentido de conseguir a "desculpa perfeita" para esmagar o projecto de Estado palestiniano.
E quando morrerem israelitas suficientes, quando Telavive conseguir o número certo de "vítimas de guerra", mortas em cafés e em autocarros, o mundo terá de compreender que Israel "não tinha outra alternativa", quando assistir, impávido, ao avanço final dos blindados Merkava e dos helicanhões Apache das Forças de "Defesa" Israelitas sobre Gaza e a Cisjordânia.

Sexta-feira passada, Esther Mucznik avisava: o Hamas "(...) só descansará quando vir o último judeu a ser atirado para o mar"..
(Público, 19Set2003, "A ferida da Palestina")

E agora pergunto-lhe eu, cara Esther:
E quando encontrará descanso o Likud?

Blind Justice


A Justiça era cega.
Depois veio a televisão. E ela viu.

domingo, setembro 21, 2003

Quem tem medo da democracia?


No Público de ontem (20Set2003, p.5, "Saudades de esquerda"), Helena Matos reflecte sobre as palavras escolhidas por Manuel Alegre, no mesmo jornal, ao afirmar que "vivemos num clima mais perverso do que aquele que vivemos na ditadura".

A "colunista" (que denominação magnífica!) desdobra-se em considerações mais ou menos ordinárias sobre a "verdadeira" perversão das "familiaridades" dos tempos da "outra senhora". Helena Matos não confunde o dito de Manuel Alegre, mas confunde-nos a nós (pelo menos grande parte de nós) ao afirmar-se confundida.

A frase de Manuel Alegre é cristalina. Demonstra que o senhor não se dá bem com a democracia que temos; que não era isto que esperava, pois nela se esbatem o negro e o branco e o que parece não é, o mais das vezes.
Mas, em democracia, é mesmo assim, não sabiam?
A democracia, em qualquer um dos seus estados, não é um sistema a branco e negro. É esse o seu esplendor e a sua miséria. A não ser assim, seria tudo menos democracia.

O artigo de Helena Matos, a quem não posso crer tenha escapado esse facto, é um bom exemplo do ponto focado por Manuel Alegre. Em certo sentido, é mesmo complementar. A perversão sempre existirá, qualquer que seja o sistema político. É mesmo uma das pedras basilares da política, como da magia. A única diferença entre a perversão totalitária e a democrática é que a primeira é básica e a segunda, como bem afirmou Manuel Alegre, é bem mais refinada. O objectivo da perversão política, em ditadura, é transformar o negro em branco, o que se torna evidente (mesmo ridículo) até para os espíritos mais pobres, como bem salienta Helena Matos. Em democracia, porém, a perversidade consta de transformar gradações de cinza em outras gradações de cinza. Como faz a ilustre "colunista", de resto, ilustrando de forma excelente o ponto de vista de Manuel Alegre.

Se ao menos isto fosse aparente a mais do que 1% dos portugueses...
Que país não seria Portugal!

Death from above


As imagens passam com uma naturalidade a que ainda não me habituei, comentadas por uma voz feminina com uma impecável pronúncia de Oxford, completamente neutra, amorfa, apenas acentuada em pontos pré-seleccionados, para realçar um final de frase ou uma "palavra chave".
A voz fala do que vemos e do seu suposto porquê; um governante assassinado, um bombista suicida, uma catástrofe natural, um acidente macabro, chamas... As imagens são sempre as mesmas; mostram sangue, dor, lágrimas, estropiados, cadáveres de crianças, execuções sumárias. Tudo com a frieza narrativa de um qualquer CD-Rom enciclopédico.

Invariavelmente, as imagens são filmadas a Sul. Sempre a Sul. Longe. Aquela miséria extrema não somos nós. São eles. E quanto mais escura for a sua tez, mais são eles. Nunca nós. Os "civilizados". Os do Norte.

Há tempos disseram-me não existir essa coisa a que chamam o "Terceiro Mundo", mas apenas o mundo. Concordo em parte, excepção feita à denominação como identificação geopolítica. De facto, "terceiro" implica um "segundo", que simplesmente não existe.
O que existe são eles, os das imagens miseráveis, os selvagens, e nós, dignamente representados na voz fleumática da BBC.

Só existem dois mundos.
O nosso.
E o deles.

Troy


A referência a Tróia, abaixo, tem directamente a ver com a música de Sinéad O'Connor e a entrada do Reflexos de Azul Eléctrico (RAE), referente ao seu Pedro e ao seu Lobo, e menos com uma entrada também do RAE em que se fala de cavalos...

Menos, note-se. :)

For the record.

It's show time


Não tenho ido tanto ao cinema como gostaria, até porque só agora começam a chegar os filmes mais interessantes, mas não pensem que me afastei das salas escuras.
A Sombra (e a blogosfera) tem causado algum desleixo na publicação do CpI, mas hoje resolvi-me.

O Cinema para Indígenas está actualizado. :)

Erro


Ir à FNAC ao dia 20 de qualquer mês.
Não vale a pena. Não aprendo.

Cry Wolf


Já queimei demasiadas Tróias...


O meu reconhecimento ao Reflexos de Azul Eléctrico.
(Por isto, mas não só, a partir de agora em permanência
nos nossos Blog Links - coerentemente).

"Mais luz." - Goëthe