Foi a
24 de Outubro de 1945.
Durante a II Guerra Mundial, nasceu o conceito
das Nações Unidas (na altura contra o nazismo,
essencialmente), depois materializado na ONU.
Como toda a História é, no imediato, escrita
pelos vencedores, o desenho da ONU foi feito
também à sua medida, de onde as regras do
Conselho de Segurança, ainda em vigor.
Organização que engloba todos os sistemas
políticos, da democracia à ditadura, parecerá
estranho que consiga regular matérias como
os Direitos Humanos ou o próprio Direito
Internacional; que pretenda regular ou mediar
conflitos quando os próprios reguladores ou
mediadores estão noutros envolvidos sem que
sejam controlados da mesma forma.
Mas...
Imaginemos o mundo sem as Nações Unidas.
Sem a UNICEF, a UNESCO, a FAO, o ACNUR... Sem um
forum onde as nações possam dialogar (mesmo as mais intolerantes). Seria um mundo melhor?
Ao contabilizar os fracassos da ONU, do Médio Oriente à Coreia do Norte, poderá parecer que a ONU é um anacronismo, uma herança gasta da II Guerra Mundial, digna sucessora da Sociedade das Nações. No entanto, é a ONU que, imperfeita como existe, tem evitado o caos total no mundo e estendido a mão a milhões de pessoas que, de outra forma, nada teriam a esperar.
Muitos acusam a ONU de dar muito (demasiado) peixe e poucas ou nenhumas canas, e terão razão, especialmente tendo em conta quem apanha o peixe, as canas e faz a festa - os que não precisam de nada disso e sim de impedir que cheguem a quem realmente necessita de ajuda.
Os jogos de poder existirão sempre e a corrupção também. Seria de esperar que ficassem à porta da sede das Nações Unidas, mas a verdade é que medram por todo o lado.
Das missões de paz nem é bom falar.
Os fiascos sucedem-se; os capacetes azuis têm sido meros bonecos de tiro ao alvo e o sangue que derramam raramente faz notícia de abertura nos telejornais. No mais recente teatro de operações, o Sul do Líbano, o pequeno corpo de interposição existente foi ameaçado pelos israelitas de que seria atacado caso empreendesse a reconstrução de pontes durante o conflito com o Hezbollah e agora que foi "musculado" e o conflito cessou temporariamente, os caças de Israel já desafiam, arrogantes, os navios de guerra da ONU. Parece que as Nações Unidas se vão atolar de novo em mais uma zona de guerra que não são capazes de controlar eficazmente. Mas os capacetes azuis, continuando a ser essencialmente alvos, conseguirão ajudar uma parte substancial da população afectada pelo conflito. Já não é mau. É, de facto, muito bom.
O principal problema da ONU é o funcionamento do Conselho de Segurança, pois o sistema de veto tem sistematicamente inviabilizado a sua actuação e o poder dissuasor da ONU, hoje perdido, não se desvaneceu recentemente, pelo envolvimento da NATO no Afeganistão e dos EUA no Iraque. Se não existe hoje esse poder, foi pelo afastamento dos EUA de tudo o que contrarie os seus próprios interesses, em especial os económicos, mesmo que isso não seja do interesse de mais nenhum país. Mas isto não é nada que os outros não façam; simplesmente, os EUA são o membro mais poderoso da ONU, em termos militares. A sua contribuição para a estrutura militar das Nações Unidas é, por isso, determinante. Inexistente, condena-a ao ridículo. A um ridículo que assim se estende à autodenominada condição de "farol das nações" dos EUA.
Talvez no dia em que os EUA percam as suas ilusões imperiais e apliquem o seu poderio militar na estrita defesa do seu solo, colocando-o à disposição da ONU, a organização recupere o seu estatuto - ou o atinja, finalmente. Mas tenho de dar razão aos neocons (o tal neologismo franco): não é de esperar tal altruísmo. As boas acções, como são entendidas no presente, não se realizam sem a contrapartida de uns bons milhões de dólares (ou euros). A humanidade é hoje uma utopia. Na realidade, define-se em moeda forte, virtual e virtualmente intocável pelo comum dos mortais (incluindo os que trabalham para o boneco em organizações como a Interpol).
Vão lá realizar
este teste (sugerido pela Karvela) e perceberão que, mesmo recusando qualquer compromisso, o vosso preço ronda o milhão de dólares. Perfeitamente acessível, portanto, aos que já nem se preocupam em rejeitar a ONU (tarefa inócua dos aspirantes a neoparvos).
Rui Semblano
25 de Outubro de 2006
Em 1971, a ONU
propôs que o dia 24 de
Outubro fosse feriado nacional em todos
os países membros.
Em 2006, em Portugal, não vi, li ou ouvi
uma palavra sobre o aniversário da ONU.
Aos que usam a boina azul celeste com
dignidade, o meu agradecimento.
nota: As imagens contêm links activos. As usual.